segunda-feira, 2 de novembro de 2015

Cessar fogo-bilateral


Ante a avalanche de notícias referentes à possibilidades de um cessar-fogo bilateral antes da firma do acordo final, consideramos necessário fazer alguns esclarecimentos, dado que consideramos uma série de imprecisões, tanto nas declarações do Presidente Santos como nas do chefe da delegação do Governo; assim como nas notas de imprensa, que a única coisa com que contribuem é para confundir, ao invés de se aproximar da possibilidade de que cheguemos em breve a essa necessária medida.
A primeira coisa a relembrar é que desde o mês de março, de maneira ininterrupta e sensata a subcomissão técnica integrada por altos oficiais ativos das Forças Armadas e por comandantes guerrilheiros encarregada de abordar o tema do cessar-fogo bilateral e definitivo e a deixação das armas vem trabalhando.
No transcurso destes 7 meses a subcomissão trabalhou na construção do texto do acordo, assim como em seus anexos e protocolos, agrupados em 7 capítulos que abordam os seguintes temas: Introdução, monitoramento e verificação, regras que regem o cessar-fogo, a segurança, logística, dispositivos no terreno e deixação das armas. Temas que cobrem por igual as partes, ainda que assumam formas distintas em cada caso e sobre os quais intercambiamos propostas, elaborado esboços conjuntos e fixado métodos para sua abordagem, seja em plenários da subcomissão ou em grupos temáticos.
Como é apenas lógico, na subcomissão, assim como na Mesa, um princípio básico é o da bilateralidade, pelo que necessariamente a construção dos textos e a tomada de decisões implica chegar a consensos. Em nenhum momento se pode esquecer que se trata de uma negociação entre partes iguais e não de um processo de submissão.
É necessário considerar que o mandato da subcomissão faz referência ao cessar-fogo que há de sobrevir com a firma do acordo final; o que o torna distinto de qualquer outra fórmula de cessar-fogo que eventualmente possam acordar as partes antes desse acordo final. Igualar essas duas situações, claramente distintas, somente se pode dar por desconhecimento do tema ou com a clara intenção de criar confusão na opinião e gerar pressão na contraparte, o qual é inaceitável.
No transcurso dos 3 anos de diálogos, as FARC-EP decretaram 5 cessar-fogos unilaterais por ocasião de processos eleitorais e mais dois como gestos de desescalada, incluídos o que está vigente atualmente e o cessar unilateral por tempo indeterminado de 21 de dezembro de 2014, que fracassou pelos sistemáticos ataques da força pública contra as guerrilhas em trégua, com saldo de mais de 30 guerrilheiros assassinados e que levou a uma escalada da guerra que pôs em risco a continuação do processo.
Os referidos cessar-fogos tiveram motivações claramente humanitárias dirigidas a salvar vidas; e motivações políticas, buscando gerar um ambiente propício às conversações. Pelo acima exposto é que não se compreende a recente proposta do Presidente Santos de condicionar um eventual cessar-fogo bilateral ao acordo sobre um dos pontos da Agenda.
Tampouco se compreende que se pretenda condicionar um eventual cessar-fogo bilateral a uma suposta concentração das guerrilhas, tema que, como se vê ao analisar os capítulos do acordo que está em construção na subcomissão técnica, não aparece por nenhuma parte.
E muito menos se compreende que se queira impor de maneira unilateral o mecanismo de monitoramento e verificação. Como todo o país conhece no acordo denominado “Agilizar em Havana e desescalar em Colômbia”, as partes acordamos convidar um representante do Secretário-Geral das NNUU e um da Presidência Pro tempore da UNASUL, para que acompanhassem as deliberações da subcomissão técnica no tema do monitoramento e da verificação, para o qual foram designados os senhores Jean Arnault e José Bayardí respectivamente, com os quais a subcomissão se reuniu em duas ocasiões, porém em nenhum momento se definiu a respeito de que organismos ou entidades possam ser parte do eventual mecanismo de monitoramento e verificação; algo que corresponde definir às partes em Mesa.
Pelo acima exposto, não vemos procedente falar de solicitar um mandato do Conselho de Segurança da ONU para a conformação do mecanismo de monitoramento e verificação de um eventual cessar-fogo, como o expressou o Presidente Santos, num novo intento governamental por impor decisões unilaterais que violam o princípio reitor da bilateralidade da Mesa.
Finalmente, se na verdade existe vontade política por parte do governo para chegar a um cessar-fogo bilateral antes da firma do acordo final, o que se necessita não é concentrar as guerrilhas em currais; basta que o Presidente Santos, em sua qualidade de Comandante das Forças Armadas, ordene às tropas oficiais suspender as operações desdobradas nas áreas contra as guerrilhas em trégua; já que, como é reconhecido por todo o país, incluída a delegação do Congresso da República com a qual nos reunimos no dia de ontem, as FARC-EP vêm cumprindo seu compromisso de cessar-fogo unilateral em cem por cento.
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Paz, referenda e implementação dos Acordos

Por Horacio Duque Giraldo
A degradação política registrada nas recentes competições eleitorais em que, como sempre, prevaleceu a corrupção, a compra e venda de votos, o clientelismo, a manipulação midiática e com as pesquisas; e o aprofundamento da crise econômica, externa e fiscal com suas consequências na situação social de milhões de colombianos pelos ajustes, cortes e aumentos de preços que se implementarão, faz cada vez mais prioritária a firma de um acordo para deixar para trás a violência e construir a paz que permita a mobilização democrática das novas forças políticas que surjam com a implementação dos acordos de Havana.
O processo de paz para deixar para trás o conflito social e armado continua sua marcha e avança em temas importantes que o tornam irreversível.
Colômbia e sua sociedade necessitam urgentemente superar a violência para resolver muitos dos problemas que a afligem em todos os campos. Os limites de seu sistema político e no funcionamento da democracia têm muita importância por suas graves incidências na participação popular. As recentes eleições locais confirmaram novamente as deformações e os vícios do sistema eleitoral e da representação.
De novo se fez sentir a compra e venda de votos, o clientelismo, a corrupção, a manipulação com os orçamentos oficiais, as maquinações com os principais meios de comunicação e a contaminação política com as pesquisas que jogaram um papel crucial na canalização do “voto útil” para favorecer os candidatos das camarilhas oligárquicas, como no caso de Bogotá.
À esquerda de pouco serve se queixar pela enésima vez sobre a natureza oportunista e trapaceira do sistema eleitoral. Essa é uma realidade super conhecida. Igual sucede no campo econômico no qual o feudalismo e o capitalismo neoliberal continuam intactos.
Nada novo no sucedido. É tendência crônica e inveterada. Pouco se descobre nesse degradado mundo da politicagem e da corrupção eleitoral.
A lamentar, isso sim, o nefasto papel do Prefeito de Bogotá, Gustavo Petro, cujo governo de supostas bandeiras progressistas propiciou, com sua generalizada corrupção, mediocridade gestora, nepotismo e caudilhismo próprio de uma “arrogante relíquia do militarismo rojaspinillista do M19”, o retorno neoliberal de Peñalosa. Petro fez um enorme dano à esquerda colombiana com seu fracasso administrativo e mediocridade à frente da Prefeitura da Capital. Com seus chefetes que agora saem com os bolsos cheios, fruto da contratação fraudulenta e ilegal, particularmente na Secretaria de Integração Social, na de Desenvolvimento Econômico, na de Governo, no Aqueduto e no IDEPAC.
Todas as suas irregularidades terminarão sendo processadas pelo sistema judicial e disciplinar com as correspondentes sanções penais, penitenciárias e políticas.
Este negro panorama faz mais urgente agilizar o processo de diálogos de Havana e a firma de um acordo geral para iniciar a construção da paz com a presença de novas forças políticas mais honestas e comprometidas com os direitos fundamentais dos trabalhadores e campesinos. O importante, de acordo com o comandante Timoleón Jiménez, é que as guerrilhas possam adiantar seu acionar político sem a ameaça da morte e do extermínio. Por isso é de tanta transcendência erradicar o fenômeno do paramilitarismo.
Nesse sentido, a decisão de iniciar o cessar-fogo bilateral a partir do próximo 16 de dezembro é um avanço muito importante. O cessar-fogo unilateral ordenado há meses pelas FARC e a desescalada do conflito com diversos atos do governo devem encerrar com a ação que se porá em marcha no fim deste ano, uma vez se definam mecanismos de verificação e se deem as garantias correspondentes aos integrantes da insurgência revolucionária, que se prepara para suas atividades agrárias pacíficas nas zonas de influência.
Adicionalmente já se debatem outros temas da agenda que têm a ver com a referenda e a implementação dos diferentes acordos alcançados.
O governo, segundo as explicações do Doutor Humberto de La Calle, privilegia para os efeitos da referenda os mecanismos constitucionais e legais vigentes: referendo, consulta popular e plebiscito, de acordo com os procedimentos fixados na Lei de mecanismos e instituições de participação cidadã. Desde logo, como produto de um acordo com as Farc na Mesa de conversações.
As Farc mantêm sem alteração sua proposta de convocar uma Constituinte soberana e popular que deve regulamentar-se conjuntamente para que dessa maneira se legitimem os acordos e se prevejam as seguranças jurídicas necessárias.
O debate está aberto nesses termos e recentemente se apresentou através do Senador Álvaro Uribe Vélez uma ideia para convocar uma Constituinte que se ocupe somente dos temas da Agenda de Paz de Havana.
Em relação à implementação dos acordos, a administração do Presidente Santos disse que o Ato legislativo para a paz, atualmente em trâmite, criará uma Comissão legislativa especial e outorgará faculdades especiais ao Chefe de Estado para que dite as normas e leis que façam efetivos os pactos alcançados.
Este é o estado atual das negociações de paz que não deve ser afetado pelas apreciações políticas sobre os resultados eleitorais recentes, que nada de novo apresentam, e pelos fenômenos da crise econômica que a cada dia cobra maior forma e se sentirá com as medidas de austeridade e cortes que se anunciam para 2016.



O obstáculo paramilitar

Por Carlos Antonio Lozada
Integrante do Secretariado do Estado-Maior das FARC-EP
Superado o impedimento com a firma do acordo sobre a criação de uma Jurisdição Especial para a Paz, aparece no horizonte da Mesa o seguinte obstáculo a ultrapassar: o paramilitarismo.
A Agenda que se discute em Havana compromete ao Governo Nacional no combate contra as organizações criminais e suas redes de apoio, a luta contra a corrupção e a impunidade e todo tipo de organização responsável por homicídios, massacres, atentados contra defensores de direitos humanos, movimentos sociais ou movimentos políticos; e de maneira expressa com o esclarecimento e desmantelamento do paramilitarismo.
Ao pensar no 23 de março de 2016 como possível data para a firma do acordo final, a pergunta lógica que ronda na cabeça dos guerrilheiros e em geral de todos aqueles colombianos golpeados e martirizados por estas estruturas criminais, que são milhões, é se nesse curto prazo o Estado está em capacidade de cumprir estes compromissos já firmados, sem o qual pensar numa paz estável e duradoura é apenas uma quimera.
Por isso é pertinente assinalar alguns elementos a levar em conta ao abordar este complicado assunto:
O primeiro tem a ver com superar o histórico negacionismo estatal frente a existência do monstro e sua paternidade em relação ao mesmo. É apenas lógico que, enquanto não se reconheça sua existência, pouco ou nada se poderá atuar contra ele.
O segundo, consequente com o primeiro, é aceitar que o dito fenômeno não se reduz aos denominados Bandos Criminais, que sem dúvida existem se entendemos por esta denominação aqueles destes grupos ligados de maneira direta com o narcotráfico; para ver mais além e reconhecer que o paramilitarismo é algo muito mais complexo e multidimensional que compreende pelo menos 3 vertentes superpostas e estreitamente inter-relacionadas no transcurso de nosso longo e histórico conflito político, social e armado.
Uma primeira dimensão do fenômeno que poderíamos chamar histórica, ligada ao latifúndio pela forma violenta que o despojo da terra adquiriu em Colômbia desde as primeiras décadas do século XX, através de bandos de ‘pássaros’ [pájaros] armados; uma segunda dimensão, de ordem ideológica, que tomou corpo em setores das Forças Armadas e do estabelecimento, bebendo da fonte norte-americana da doutrina contra insurgente de segurança nacional e do inimigo interno, na época da guerra fria; e uma terceira dimensão, ligada ao caciquismo regional, à corrupção dos poderes locais, todos os tipos de economia ilegal que se dá nos territórios e o mercenarismo através de empresas de segurança a serviço de companhias transnacionais e monopólios nacionais.
Pelo acima exposto, no nosso modo de ver, qualquer política realmente séria que busque acabar com este flagelo, ademais do combate frontal aos bandos armados, necessariamente tem que partir de uma mudança no modelo de Estado contra insurgente; o que se deve traduzir em medidas dirigidas a desarticular e desestimular o fenômeno nas três dimensões já mencionadas.
Acabar com o paramilitarismo na raiz passa por erradicá-lo das mentes das elites econômicas e políticas, que veem na continuação da guerra uma garantia para a perpetuação de seus privilégios.
Só assim poderá haver realmente garantias de não repetição e segurança plena para as forças sociais e políticas alternativas, incluídas aquelas que surjam a partir da insurgência, aos cenários da política aberta, para entrar a disputar com nossas propostas e visão de país o favor das maiorias.
Só assim se poderá tornar realidade o sonho de paz, a reconciliação e a reconstrução da Colômbia.



Delegações da Irlanda do Norte e do Congresso Nacional Africano se reúnem com a Delegação de Paz das FARC

A visita de três dias está sendo organizada pela ONG, com sede em Londres, Justice for Colombia, e forma parte de uma iniciativa que lá leva três anos em brindar apoio internacional e compartilhar experiências com os Delegados do Governo da Colômbia e das FARC. O grupo inclui Ebrahim Ebrahim e Mohammed Bhabha, do CNA, e será a primeira vez que representantes do partido CNA viajam para se reunir com a Delegação de Paz das FARC. A comitiva também conta com parlamentares de diferentes partidos da Irlanda do Norte – Paul Maskey, representante pelo partido Sinn Fein; Mark Durkan, representante pelo Partido Social-Democrata e Trabalhista [SDLP]; Jeffrey Donaldson, representante pelo Partido Unionista Democrático e anterior membro do Exército Britânico; e o Reverendo Harold Good, quem verificou a deixação de armas do IRA e quem tem sido celebrado internacionalmente por seu papel no Acordo de Sexta-Feira Santa.
Mariela Kohon, Diretora de Justice for Colombia, disse:
"Sabemos da importância do apoio internacional para o processo de paz que pôs fim ao conflito na Irlanda do Norte, e por isso Justice for Colombia foi construindo iniciativas para brindar apoio moral e prático para os diálogos de paz. Centenas de milhares de pessoas perderam suas vidas nesta guerra e agora estamos mais perto que nunca de um acordo de paz. Esperamos que esta delegação e a importante experiência de seus integrantes possa continuar aproximando a Colômbia da paz.”
A visita vem depois de um giro de três dias também organizado por Justice for Colombia em que advogados britânicos e irlandeses se reuniram em Havana com membros da Comissão Jurídica assessorando a Delegação das FARC.

La Habana Cuba, 23 de outubro de 2015
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