Por:Editorial da Edição 450 do Jornal Inverta
O ex-presidente Luis Inácio Lula da Silva tinha um sonho. Assim como qualquer operário, sonhava em tirar a massa trabalhadora da miséria e do sofrimento imposto pelo mundo do capital em anos e anos a fio de dominação. Sonhava com o pleno emprego, aumento salarial, moradia, saúde, educação, ajudar aos povos irmãos, em suma, uma vida decente para aqueles que dependem exclusivamente de sua força de trabalho para a subsistência de sua modesta família. Para realizar seu sonho, uma vez conquistado o comando do governo federal por meio de massiva votação popular, passou a realizar inúmeras reformas estruturais nas mais variadas esferas da máquina burguesa e saiu distribuindo verbas para que suas reformas fossem aprovadas.
Depois de 8 anos, mesmo comprando votos, acabou por não realizar o sonho. No fim do seu governo, Lula, orgulhoso, enchia o peito para falar que seu governo foi quem pagou a bilionária e duvidosa dívida com o Fundo Monetário Internacional (FMI). Enquanto falava com zombaria que agora é o Brasil que é credor da instituição imperialista, se desculpava por não quitar a histórica dívida com o seu próprio povo trabalhador, aquele que lhe propiciou o comando do país. Para se justificar perante ao povo e eleger seu sucessor, falou que o tempo foi pouco, que foi traído.
Dilma Roussef foi eleita para dar continuidade às conquistas do governo Lula e sob a promessa de erradicar de uma vez por todas a extrema miséria que ainda aterroriza milhões de trabalhadores e seus entes queridos. É certo que a primeira presidenta do país conquistou milhões de votos graças ao prestígio e popularidade de Lula. Também é claro que esta transferência não seria concretizada se não fosse o ódio da população das forças reacionárias das oligarquias - "de oposição", segundo a mídia - contra o governo Lula e a campanha do PT e aliados, forças aglutinadas em torno da candidatura de José Serra e seus aliados boys neoliberais (PSDB, PFL, PPS e cúpula do PV). Serra representa o retrocesso à cartilha neoliberal e à aventura imperialista das oligarquias, apesar de a mídia apresentar em sua telinha mágica que esta tal "oposição" é quem deve ser a vanguarda do povo, como, por exemplo, a fraude de sua defesa de um Salário Mínimo de R$ 600,00, justamente eles que, quando no governo, o jogaram para o valor mais baixo da história! A "oposição" seduziu só a esquerda oportunista.
Assim como o seu companheiro antecessor, Dilma foi eleita massivamente pela população pobre, mas, para governar, está amarrada a um amplo arco de alianças no Executivo e Parlamento, num leque maior que o do governo Lula. No sistema representativo burguês, a massa acompanha de longe o governo quando elege o candidato de sua preferência; a base aliada, isto é, as forças e frações que compõem a chapa eleita, ao contrário, não só cobram imediatamente a fatura das urnas como lutam pela maior e melhor fatia do recém governo em nome da governabilidade. A aliança com setores da direita (médios e grandes empresários nacionais, fração do agronegócio e de banqueiros) e com o velho "centrão" (funcionalismo, entidades representativas) não só viabilizou a eleição e o governo Lula como também desencadeou toda a podridão que se viu (corrupção, mensalão, cartões corporativos, nomeações secretas, caixa dois). Dilma assume uma estrutura administrativa burguesa arcaica loteada pelos velhos aliados e ainda tem que acomodar os aliados de última hora.
Podemos ver as amarras, a equação governo + aliados, por exemplo, no setor elétrico. Secretária de Minas e Energia do Rio Grande do Sul (1993 a 1994), no governo Olívio Dutra, e Ministra de Minas e Energia (2003 a 2005), no governo Lula, a presidenta fez sua carreira política precisamente no setor elétrico. Só saiu daí para assumir a Casa Civil, o segundo cargo mais importante da República. Apesar de toda sua força no setor e no governo Lula, quem joga as cartas no setor é o PMDB, particularmente pelas mãos do senador e ex-presidente José Sarney. O ministro que sucedeu Dilma ainda durante o governo Lula na pasta de energia foi Edison Lobão (PMDB-MA), nome indicado por Sarney. Lobão foi reconduzido à pasta pela presidenta Dilma uma vez que havia se afastado para disputar um cargo no Senado. Também são ligados ao senador o novo presidente da Eletrobras, José da Costa Carvalho Neto (Cemig), e o de Furnas, Flávio Decat (Eletronorte), nomeados recentemente por Dilma.
Dilma não vai conseguir mudar o país em 100 dias, tampouco tomar medidas ousadas e imediatas que beneficie o povo pobre. Esse discurso poderia até ser aceito por qualquer analfabeto político. O loteamento que ocorre no ministério de Minas e Energia pelo PMDB de Sarney também se dá em outros ministérios e autarquias, distribuídos entre os principais líderes dos partidos da base aliada, o PT (de Palocci a Carlos Lessa), PMDB, PR, PSB, PP, PCdoB. Nem sequer os ministérios do Trabalho ou da Previdência foram entregues às mãos de um nome ligado às centrais sindicais, por mais pelega que seja. O mesmo ocorre com o Ministério da Reforma Agrária e os camponeses. Quem está na frente da reforma agrária são os senhores ligados ao agronegócio. Por isso que a coisa não avança no nosso sentido, só avança em sentido contrário aos interesses da maioria da população. A extrema direita e os grandes banqueiros e multinacionais foram fragorosamente derrotados nas eleições. Perder a disputa pelo governo ou administração da coisa pública não significa perder o poder sobre todos os meios de produção, distribuição e propaganda. A manutenção do poder sobre estes meios acaba por exercer de forma indireta, e até mesmo de forma bem direta, influência nos rumos da política econômica e, consequentemente, na direção do desenvolvimento em geral e nos setores que vão prosperar ou quebrar. A grande mídia, órgão ideológico da extrema direita e dos megas negócios especulativos no país, pressiona o governo como um todo, e o próprio povo, para que Dilma exerça uma administração "técnica" e não "política", negando com isso o resultado das urnas. Com uma bela palavra (técnica no sentido de "arte" ou "ciência"), que encanta à esquerda oportunista, procura manobrar o governo e o povo para adotar medidas e políticas orientadas pela literatura liberal e "moderna", qual seja, a cartilha neoliberal! Nos dizem que o governo não pode ser guiado pelo "barulho" das ruas, isto é, não pode ser político, no sentido de classe (não no sentido vulgar, da politicagem), mas é exatamente isso que queremos.
A tal imparcialidade e tecnicidade cultuadas pela mídia, extrema direta e esquerda oportunista significa colocar os /Chicago Boys/ nos postos chaves do comando da economia, um atalho para a cartilha neoliberal de FHC e Collor no governo de Dilma. As nomeações pela presidenta de Antonio Palocci, para chefiar a Casa Civil, Guido Mantega, para o Ministério da Fazenda, e Alexandre Tombini, presidente do Banco Central, representam uma grave concessão à cartilha neoliberal do império (EUA). É só observar as velhas medidas de choque da "imparcialidade técnica" da política monetária: sob a possibilidade (não realidade) de um eventual aumento de inflação para além de uma tal meta acertada com o mercado financeiro, o governo aumentou em duas reuniões do Banco Central, não "político", duas vezes consecutivas a taxa Selic - taxa básica de referência da política monetária e de juros cobradas pelo mercado. A taxa se mantém no patamar mais alto do planeta, mantendo o Brasil no centro da especulação mundial.
A literatura liberal ensina também que, para conter o monstro da inflação, é só adotar uma simples receita: reduzir o consumo, a demanda ou a procura, em palavras não "técnicas, reduzir salários e benefícios trabalhistas. Mantega, que por ironia é do Partido dos Trabalhadores (PT), segurou o Salário Mínimo abaixo do mínimo necessário, os R$ 545,00, para não provocar o descontrole da inflação, sangrar a meta fiscal e quebrar o país! O velho antídoto do terror econômico neoliberal contra o monstro da inflação. Se não bastasse essa tragédia, Mantega fechou o seu discurso no Parlamento, de maioria governista, com a farsa: segurou o mínimo porque veio justamente "para defender a política de valorização do salário mínimo". Em suma, não há arte, ciência ou técnica nestas medidas, mas sim o medíocre repeteco da cartilha neoliberal - política dos que votaram em José Serra; tampouco há imparcialidade nelas, uma vez que beneficiam diretamente banqueiros, especuladores e empresários contra a massa trabalhadora e população pobre do país - os que votaram em Dilma.
O tratamento dispensado à visita do presidente do império em nosso país também foi digno de uma autêntica colônia, como nos tempos de FHC. A escolta que a segurança e o exército nacional propiciaram ao chefe do terror imperialista não teve par em nossa história, uma operação de guerra para proteger a ave de rapina. Para participar da palestra de Barack Obama (B.O.) no Fórum Empresarial Brasil-Estados Unidos ("Brasil" na frente mesmo), até ministros de estado de nosso país tiveram que passar pelo "constrangimento" (como nossa imprensa é subserviente) da revista feita pelos jagunços da segurança do presidente ianque. E o discurso foi feito em nosso país e a convite do nosso governo, o governo Dilma! Como não havia equipamento de tradução simultânea, os nossos ministros nacionalistas deixaram o Fórum.
Diante da fortaleza e segurança dada pelo nosso país e após o primeiro encontro com a presidenta Dilma, B. O. ordenou o início dos ataques aéreos na Líbia. Após o seu discurso no Fórum Empresarial, B. O. se reuniu sob portas fechadas com apenas jornalistas dos Estados Unidos para comunicar o início da ofensiva contra mais um país "hostil". A extrema direita e a mídia comemoram não só o ataque, mas o ataque a partir de nossa terra pacífica. Em troca, Dilma pediu o alívio das barreiras alfandegárias sobre alguns produtos, o fim da necessidade do visto para quem for visitar o monstro de dentro e uma cadeira no Conselho de Segurança da ONU. O Círculo de Fogo se fecha sobre nós, mas nenhuma palavra foi pronunciada contra o terrorismo de estado praticado pelos EUA e nenhuma palavra contra a violação de direitos humanos praticados pelos EUA. Ao contrário, a primeira medida tomada pelo governo Dilma foi a aprovação de resolução da ONU que autoriza o uso da força contra a Líbia.
A direita consegue manobrar o governo e a sociedade não apenas por dominar a economia como um todo e as estruturas arcaicas da democracia burguesa, mas, sobretudo, pela divisão dentro da esquerda institucional (PV, PSOL, PSTU, PCO).
A direita manobrou a esquerda para forjar o segundo turno das eleições e manobra agora para desgastar os setores minimamente progressistas existente dentro do governo do PT e aliados. Em troca de um pequenino espaço que a mídia lhe concede nos momentos decisivos, esta esquerda oportunista faz a mesma critica que a velhaca direitona faz. É a farsa em troca do seu minuto de fama. Usam o precioso espaço midiático não para chamar o povo para lutar por melhores condições de trabalho, vida e internacionalismo proletário, mas para defender as mesmas bandeiras da direita (defesa do salário de R$ 600,00; por um governo "técnico", luta contra as mesmas "ditaduras" assim rotuladas pelo imperialismo; intransigência contra a aliança dos povos latino-americanos). O povo tem seu modo de dar o seu recado nesta caricatura de esquerda: elegendo o humorista Tiririca.
De nada adianta o minuto de fama da esquerda ou o espetáculo dos humoristas. Temos que criar comitês de luta, não eleitoreiros, contra o terrorismo neoliberal e imperialista. Comitês voltados diretamente para objetivos imediatos e de longo prazo do povo brasileiro, fundamentalmente a defesa e luta pelo emprego, pelo desenvolvimento econômico através de obras de infraestrutura básica (escolas, hospitais, saneamento, energia), pela segurança alimentar, pela manutenção dos setores estratégicos do país (pré-sal, petróleo, energia elétrica, telecomunicações, transporte público), pela defesa das reservas de água e biodiversidade, pelo avanço da integração econômica, política e militar com os demais países da América Latina, África e Ásia. Em suma, as bases antagônicas à cartilha técnica neoliberal e a hegemonia imparcial ianque.
A unidade das forças progressistas da sociedade em torno destes comitês deve ser, como medida imediata, para pressionar o governo Dilma a cumprir os compromissos e objetivos assumidos com o povo trabalhador brasileiro. A crítica deve ser direcionada contra qualquer retrocesso às condições de vida do governo FHC, contra a cartilha neoliberal e contra a ameaça imperialista e das oligarquias locais de agressão aos países irmãos da América Latina, África e Ásia.
Fora com todas as bases militares norte-americanas no continente!
Fora OTAN da Líbia, Iraque e Afeganistão!
Contra a anexação da Colômbia pelos Estados Unidos!
Pela libertação dos Cinco Heróis Cubanos!
Pela libertação de todos os presos políticos do império!
Pelo fim do bloqueio a Cuba!
Ousar Lutar! Ousar Vencer! Venceremos!
Redação do OC
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