DOMINGO,
13 NOVEMBRo 2016 04:15 escrito por farc-ep
DISCURSO
DAS FARC-EP NO ENCERRAMENTO Do ACoRDO DE PAZ DEFINITIVO.
Nossa
saudação cordial ao ministro de Relações Exteriores de Cuba,
Bruno Rodríguez, e por seu intermédio, aos comandantes Fidel e Raúl
que generosamente ofereceram seu território e a logística
necessária para que os colombianos resolvêssemos nossas diferenças;
saúdo aos representantes dos países garantidores, Noruega e Cuba,
que estiveram sempre ao lado dos plenipotenciários nos momentos mais
difíceis e nos de satisfação impulsando contra vento e maré os
avanços da Mesa; saúdo aos “anjos da guarda” do processo de
paz, como denominara Roy Chaderton aos acompanhantes da República
Bolivariana de Venezuela e da República do Chile. Em nome da
Colômbia, gratos por nos ajudar durante tanto tempo a encontrar o
caminho da reconciliação e da paz. Obrigado por sua imensa
solidariedade.
Doutor
Humberto de La Calle e representantes do Governo da Colômbia
Companheiros
da Delegação de Paz das FARC
Compatriotas:
Trabalhamos
de maneira incansável dia e noite para entrelaçar num só corpo de
consenso os elementos do novo acordo final sobre o qual começaremos
a edificação da paz estável e duradoura para Colômbia.
No
dia de hoje, como resultado da inquebrantável vontade e decisão das
partes, de sua perseverante busca de uma solução política à longa
confrontação armada, apresentamos à nação colombiana o novo
Acordo de Paz DEFINITIVO,
que preferimos chamar de o ACORDO DA ESPERANÇA, poderoso instrumento
para a democratização do país e para a materialização dos
direitos das pessoas.
Foram
semanas de árduo trabalho, de audiências sucessivas, de exercício
humilde de ouvir com interesse e respeito, de interlocução com o
mais amplo espectro do movimento social e político, e das igrejas.
Foram semanas de muito difíceis porém frutíferas conversações
com a delegação governamental que permitiram reafirmar a vocação
de paz e reconciliação de um país, ao tempo em que possibilitaram
compreender e esclarecer dúvidas e inquietudes razoáveis de
diversos setores da sociedade, e também desvirtuar tergiversações
e falácias a respeito do acordo subscrito no 26 de setembro passado
na Cidade Heroica, Cartagena de Índias.
O
resultado do plebiscito de 2 de outubro produziu um impacto, que,
ademais de obstruir os mecanismos de implementação previstos,
puseram em sério risco cinco anos de esforços na busca da
reconciliação.
Porém,
para felicidade de milhões de compatriotas, a paz continua sua
marcha irrefreável, IRREFREÁVEL. As espontâneas e multitudinárias
mobilizações sociais de apoio à paz ativadas pela juventude, as
numerosas manifestações de organizações sociais e populares, de
partidos e movimentos políticos, e o reiterado acompanhamento da
comunidade internacional nos impelem a pensar que se iniciou a grande
mudança histórica para uma sociedade autenticamente democrática,
pacífica e justa.
Os
resultados de outubro também nos levaram a pensar em sentido mais
reflexivo acerca dos limites da democracia liberal e da regra
majoritária, particularmente quando esta se estabelece sob as
condições de maiúscula abstenção e quando estão em jogo
decisões de semelhante transcendência, como as que concernem à
possibilidade histórica do bem viver e em paz para as novas
gerações.
Recordamos,
nesse contexto, nossas visões de democracia discutidas na Mesa, que
apenas alcançaram a ser recolhidas de maneira muito parcial no
acordo sobre “abertura democrática”. E reforçamos nossas
certezas da necessidade de lutar por novos entendimentos, projetos e
procedimentos democráticos que transcendam o simples sufrágio, a
fim de garantir uma verdadeira participação social e cidadã nos
assuntos que incidem sobre a vida nacional.
Ainda
em condições dessa precariedade democrática, na medida em que
acessamos ao procedimento de referenda plebiscitária na busca da paz
desejada, entendemos que, apesar da frágil maioria, tínhamos o
compromisso político de aceitar o resultado desfavorável e de
atender as múltiplas vozes que o haviam propiciado, distinguindo
entre aquelas que manifestavam preocupações sinceras por um novo e
melhor acordo e outras que tinham a pretensão de se erigir em
obstáculo para a consecução do propósito superior, ainda que,
dada a conjuntura, se acobertaram também com o manto e o discurso da
paz.
Compreendemos
melhor, então, o sentido do pluralismo e da diversidade, dos
interesses particulares e de grupos e setores específicos do
conglomerado social, que –em meio à conflagração que é inerente
à ordem vigente- merecem respeito e reconhecimento. O mesmo que
reivindicamos para nós.
Assim
é que, em atenção a isso, nos demos à tarefa, junto com o Governo
Nacional, de reabrir a discussão na Mesa de Havana, para considerar
–com o rigor exigido pelas circunstâncias- todas e cada uma das
propostas de precisão e ajuste do acordo subscrito a 26 de setembro,
sob o entendido de que se tratava de um aperfeiçoamento do já
combinado, tendo em conta o manifestado por todos os setores
políticos e sociais que participaram num plebiscito cujos resultados
não deviam ser compreendidos como uma negativa ao acordo mas sim
como um chamado a seu melhoramento.
Ainda
que a X Conferência Nacional Guerrilheira referendou o texto de um
acordo que para nós já estava fechado, compreendemos a importância
de reformulá-lo com um maior consenso que incorporasse muitas vozes
que estiveram ausentes durante o processo de conversações e que,
inclusive tendo dito Não, têm seu sentimento do lado da
reconciliação.
Somos
conscientes de que a possibilidade real de expandir a potência
transformadora dos acordos descansa sobre sua legitimidade política
e social. Por tal razão, nos produz uma imensa satisfação anunciar
que, ao tempo em que o novo Acordo alcançado preserva a estrutura e
o espírito do primeiro acordo pactuado, incorpora um sem-número de
ajustes e precisões, que recolhe observações e novas propostas de
redação, que formula aclarações e dirime dúvidas onde se
considerou necessário. Por exemplo, em matéria de Jurisdição
Especial para a Paz foram incorporadas nada menos de 65% das
propostas provenientes dos diversos setores que votaram NÃO no
plebiscito; quase 90% das iniciativas referentes ao polêmico tema de
gênero; e algo mais de 100 variações que tocam nos temas
concernentes à Reforma Rural Integral, Participação Política,
Nova política antidrogas, Vítimas, Fim do conflito e implementação
e verificação.
A
propósito, de nossa parte cedemos, inclusive estendendo fronteiras
que nos havíamos traçado, deslocando-as até os limites do razoável
e aceitável para uma organização político-militar cujas armas não
foram vencidas; que acorreu, portanto, à mesa de diálogos para uma
negociação e não a um processo de submissão; e que tomou a
decisão de participar na vida política legal, se se cumpre um
conjunto de condições que o façam possível.
Dissemos
à sociedade colombiana que realizamos nosso melhor esforço por
responder aos anseios de paz, e podemos afirmar com a cabeça erguida
que cumprimos e que ao novo acordo o único caminho que o espera é
sua implementação, tendo em conta que com ele ficam assentadas as
bases para começar uma tarefa ainda mais difícil e complexa: a
construção de uma paz estável e duradoura, à qual esperamos
possam se somar, com novos aportes, fruto de sua negociação, os
companheiros do Exército de Libertação Nacional, e que toda a
institucionalidade do Estado, o poder Executivo, o Congresso da
República, as altas Cortes, a Promotoria General da Nação, as
Forças Militares e de Polícia assumam seu respaldo.
Com
o novo Acordo Final se geram condições para iniciar o difícil
processo da reconciliação nacional, propósito que compromete as
diferentes classes sociais, ao empresariado nacional, aos setores
médios da população, a classe trabalhadora urbana e rural, aos
intelectuais e artistas, aos trabalhadores da cultura, as comunidades
campesinas, indígenas e afrodescendentes, a comunidade LGBTI, as
mulheres e homens humildes, e desde logo a nossos guerrilheiros, que
com expectativa estiveram em paciente a disciplinada espera; e também
a todos os partidos e movimentos políticos e sociais.
A
firma deste novo acordo deve dar início à construção do país da
concórdia que levamos no coração e com o qual sonhamos durante
toda a vida. Porém o mero acordo não é suficiente, porque um papel
florescido de promessas e boas intenções, sem vedoria cidadã,
facilmente pode ser arrastado pelo vento da indolência para o
deserto do nada e da frustração da esperança. Reiteramos: o
principal garantidor do cumprimento e da implementação dos acordos,
ademais do componente internacional, é o próprio povo e suas
organizações, porque ninguém melhor que ele pode sentir a urgência
de sua concretização, porque toca com sua dignidade e seu direito a
viver em paz.
Está
triunfando a paz, não duvidamos. Nos sentimos orgulhosos de que a
Colômbia continua sendo referência mundial de paz.
Reiteramos
o chamado que fizéramos com o Governo a combinar com todas as forças
vivas do país “um grande ACORDO POLÍTICO NACIONAL encaminhado a
definir as reformas e os ajustes institucionais necessários para
atender aos desafios que a paz demande, pondo em marcha um novo marco
de convivência política e social”.
É
tempo de paz; de desdobramento de uma contenda política que admita,
sem o exercício estrutural da violência e do recurso das armas, a
existência de diversas visões de sociedade e na qual se possa lutar
por elas pela via democrática. Que a contenda se translade ao campo
das ideias empunhando no mais alto das consciências a bandeira da
verdade e da honradez.
Que
ninguém obstaculize os sonhos e as esperanças de milhões de almas.
Façamos da paz uma condição estável e duradoura sobre a base do
respeito aos direitos do povo e à justiça social. Nosso futuro está
fortemente ligado ao direito à terra, à saúde, à educação, à
vida digna, para que ninguém em Colômbia recaia na desesperança.
Chegou o momento da construção de sonhos e de dar vida à esperança
mediante a luta política, preenchendo nossos corações do mais
imenso amor pela pátria.
Com
a voz do tribuno do povo Jorge Eliécer Gaitán, digamos uma vez
mais: “Bem-aventurados os que entendem que as palavras de concórdia
e de paz não devem servir para ocultar sentimentos de rancor e
extermínio...”
Que
renasçam, então, da luz deste Acordo de Paz, as borboletas amarelas
de Mauricio Babilonia para que invadam com seu amor e reconciliação
todos os rincões deste grande Macondo que é Colômbia.
Amamos
a paz, amamos a Colômbia. Que Deus e o comandante Manuel Marulanda
Vélez abençoem este acordo.
Muito
obrigado.
DELEGAÇÃO
DE PAZ DAS FARC-EP
Habana
12.11.2016