terça-feira, 15 de novembro de 2016

Discurso das FARC-EP no encerramento do acordo de paz definitivo.

DOMINGO, 13 NOVEMBRo 2016 04:15 escrito por farc-ep
DISCURSO DAS FARC-EP NO ENCERRAMENTO Do ACoRDO DE PAZ DEFINITIVO.
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Nossa saudação cordial ao ministro de Relações Exteriores de Cuba, Bruno Rodríguez, e por seu intermédio, aos comandantes Fidel e Raúl que generosamente ofereceram seu território e a logística necessária para que os colombianos resolvêssemos nossas diferenças; saúdo aos representantes dos países garantidores, Noruega e Cuba, que estiveram sempre ao lado dos plenipotenciários nos momentos mais difíceis e nos de satisfação impulsando contra vento e maré os avanços da Mesa; saúdo aos “anjos da guarda” do processo de paz, como denominara Roy Chaderton aos acompanhantes da República Bolivariana de Venezuela e da República do Chile. Em nome da Colômbia, gratos por nos ajudar durante tanto tempo a encontrar o caminho da reconciliação e da paz. Obrigado por sua imensa solidariedade.
Doutor Humberto de La Calle e representantes do Governo da Colômbia
Companheiros da Delegação de Paz das FARC
Compatriotas:
Trabalhamos de maneira incansável dia e noite para entrelaçar num só corpo de consenso os elementos do novo acordo final sobre o qual começaremos a edificação da paz estável e duradoura para Colômbia.
No dia de hoje, como resultado da inquebrantável vontade e decisão das partes, de sua perseverante busca de uma solução política à longa confrontação armada, apresentamos à nação colombiana o novo Acordo de Paz DEFINITIVO, que preferimos chamar de o ACORDO DA ESPERANÇA, poderoso instrumento para a democratização do país e para a materialização dos direitos das pessoas.
Foram semanas de árduo trabalho, de audiências sucessivas, de exercício humilde de ouvir com interesse e respeito, de interlocução com o mais amplo espectro do movimento social e político, e das igrejas. Foram semanas de muito difíceis porém frutíferas conversações com a delegação governamental que permitiram reafirmar a vocação de paz e reconciliação de um país, ao tempo em que possibilitaram compreender e esclarecer dúvidas e inquietudes razoáveis de diversos setores da sociedade, e também desvirtuar tergiversações e falácias a respeito do acordo subscrito no 26 de setembro passado na Cidade Heroica, Cartagena de Índias.
O resultado do plebiscito de 2 de outubro produziu um impacto, que, ademais de obstruir os mecanismos de implementação previstos, puseram em sério risco cinco anos de esforços na busca da reconciliação.
Porém, para felicidade de milhões de compatriotas, a paz continua sua marcha irrefreável, IRREFREÁVEL. As espontâneas e multitudinárias mobilizações sociais de apoio à paz ativadas pela juventude, as numerosas manifestações de organizações sociais e populares, de partidos e movimentos políticos, e o reiterado acompanhamento da comunidade internacional nos impelem a pensar que se iniciou a grande mudança histórica para uma sociedade autenticamente democrática, pacífica e justa.
Os resultados de outubro também nos levaram a pensar em sentido mais reflexivo acerca dos limites da democracia liberal e da regra majoritária, particularmente quando esta se estabelece sob as condições de maiúscula abstenção e quando estão em jogo decisões de semelhante transcendência, como as que concernem à possibilidade histórica do bem viver e em paz para as novas gerações.
Recordamos, nesse contexto, nossas visões de democracia discutidas na Mesa, que apenas alcançaram a ser recolhidas de maneira muito parcial no acordo sobre “abertura democrática”. E reforçamos nossas certezas da necessidade de lutar por novos entendimentos, projetos e procedimentos democráticos que transcendam o simples sufrágio, a fim de garantir uma verdadeira participação social e cidadã nos assuntos que incidem sobre a vida nacional.
Ainda em condições dessa precariedade democrática, na medida em que acessamos ao procedimento de referenda plebiscitária na busca da paz desejada, entendemos que, apesar da frágil maioria, tínhamos o compromisso político de aceitar o resultado desfavorável e de atender as múltiplas vozes que o haviam propiciado, distinguindo entre aquelas que manifestavam preocupações sinceras por um novo e melhor acordo e outras que tinham a pretensão de se erigir em obstáculo para a consecução do propósito superior, ainda que, dada a conjuntura, se acobertaram também com o manto e o discurso da paz.
Compreendemos melhor, então, o sentido do pluralismo e da diversidade, dos interesses particulares e de grupos e setores específicos do conglomerado social, que –em meio à conflagração que é inerente à ordem vigente- merecem respeito e reconhecimento. O mesmo que reivindicamos para nós.
Assim é que, em atenção a isso, nos demos à tarefa, junto com o Governo Nacional, de reabrir a discussão na Mesa de Havana, para considerar –com o rigor exigido pelas circunstâncias- todas e cada uma das propostas de precisão e ajuste do acordo subscrito a 26 de setembro, sob o entendido de que se tratava de um aperfeiçoamento do já combinado, tendo em conta o manifestado por todos os setores políticos e sociais que participaram num plebiscito cujos resultados não deviam ser compreendidos como uma negativa ao acordo mas sim como um chamado a seu melhoramento.
Ainda que a X Conferência Nacional Guerrilheira referendou o texto de um acordo que para nós já estava fechado, compreendemos a importância de reformulá-lo com um maior consenso que incorporasse muitas vozes que estiveram ausentes durante o processo de conversações e que, inclusive tendo dito Não, têm seu sentimento do lado da reconciliação.
Somos conscientes de que a possibilidade real de expandir a potência transformadora dos acordos descansa sobre sua legitimidade política e social. Por tal razão, nos produz uma imensa satisfação anunciar que, ao tempo em que o novo Acordo alcançado preserva a estrutura e o espírito do primeiro acordo pactuado, incorpora um sem-número de ajustes e precisões, que recolhe observações e novas propostas de redação, que formula aclarações e dirime dúvidas onde se considerou necessário. Por exemplo, em matéria de Jurisdição Especial para a Paz foram incorporadas nada menos de 65% das propostas provenientes dos diversos setores que votaram NÃO no plebiscito; quase 90% das iniciativas referentes ao polêmico tema de gênero; e algo mais de 100 variações que tocam nos temas concernentes à Reforma Rural Integral, Participação Política, Nova política antidrogas, Vítimas, Fim do conflito e implementação e verificação.
A propósito, de nossa parte cedemos, inclusive estendendo fronteiras que nos havíamos traçado, deslocando-as até os limites do razoável e aceitável para uma organização político-militar cujas armas não foram vencidas; que acorreu, portanto, à mesa de diálogos para uma negociação e não a um processo de submissão; e que tomou a decisão de participar na vida política legal, se se cumpre um conjunto de condições que o façam possível.
Dissemos à sociedade colombiana que realizamos nosso melhor esforço por responder aos anseios de paz, e podemos afirmar com a cabeça erguida que cumprimos e que ao novo acordo o único caminho que o espera é sua implementação, tendo em conta que com ele ficam assentadas as bases para começar uma tarefa ainda mais difícil e complexa: a construção de uma paz estável e duradoura, à qual esperamos possam se somar, com novos aportes, fruto de sua negociação, os companheiros do Exército de Libertação Nacional, e que toda a institucionalidade do Estado, o poder Executivo, o Congresso da República, as altas Cortes, a Promotoria General da Nação, as Forças Militares e de Polícia assumam seu respaldo.
Com o novo Acordo Final se geram condições para iniciar o difícil processo da reconciliação nacional, propósito que compromete as diferentes classes sociais, ao empresariado nacional, aos setores médios da população, a classe trabalhadora urbana e rural, aos intelectuais e artistas, aos trabalhadores da cultura, as comunidades campesinas, indígenas e afrodescendentes, a comunidade LGBTI, as mulheres e homens humildes, e desde logo a nossos guerrilheiros, que com expectativa estiveram em paciente a disciplinada espera; e também a todos os partidos e movimentos políticos e sociais.
A firma deste novo acordo deve dar início à construção do país da concórdia que levamos no coração e com o qual sonhamos durante toda a vida. Porém o mero acordo não é suficiente, porque um papel florescido de promessas e boas intenções, sem vedoria cidadã, facilmente pode ser arrastado pelo vento da indolência para o deserto do nada e da frustração da esperança. Reiteramos: o principal garantidor do cumprimento e da implementação dos acordos, ademais do componente internacional, é o próprio povo e suas organizações, porque ninguém melhor que ele pode sentir a urgência de sua concretização, porque toca com sua dignidade e seu direito a viver em paz.
Está triunfando a paz, não duvidamos. Nos sentimos orgulhosos de que a Colômbia continua sendo referência mundial de paz.
Reiteramos o chamado que fizéramos com o Governo a combinar com todas as forças vivas do país “um grande ACORDO POLÍTICO NACIONAL encaminhado a definir as reformas e os ajustes institucionais necessários para atender aos desafios que a paz demande, pondo em marcha um novo marco de convivência política e social”.
É tempo de paz; de desdobramento de uma contenda política que admita, sem o exercício estrutural da violência e do recurso das armas, a existência de diversas visões de sociedade e na qual se possa lutar por elas pela via democrática. Que a contenda se translade ao campo das ideias empunhando no mais alto das consciências a bandeira da verdade e da honradez.
Que ninguém obstaculize os sonhos e as esperanças de milhões de almas. Façamos da paz uma condição estável e duradoura sobre a base do respeito aos direitos do povo e à justiça social. Nosso futuro está fortemente ligado ao direito à terra, à saúde, à educação, à vida digna, para que ninguém em Colômbia recaia na desesperança. Chegou o momento da construção de sonhos e de dar vida à esperança mediante a luta política, preenchendo nossos corações do mais imenso amor pela pátria.
Com a voz do tribuno do povo Jorge Eliécer Gaitán, digamos uma vez mais: “Bem-aventurados os que entendem que as palavras de concórdia e de paz não devem servir para ocultar sentimentos de rancor e extermínio...”
Que renasçam, então, da luz deste Acordo de Paz, as borboletas amarelas de Mauricio Babilonia para que invadam com seu amor e reconciliação todos os rincões deste grande Macondo que é Colômbia.
Amamos a paz, amamos a Colômbia. Que Deus e o comandante Manuel Marulanda Vélez abençoem este acordo.
Muito obrigado.
DELEGAÇÃO DE PAZ DAS FARC-EP
Habana 12.11.2016


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