“É muito difícil ver um chefe de família ter que viver na minha condição”, desabafa bombeiro
Trabalhadores acamparam em salão do Congresso para pressionar a votação do PEC 300, que estabelece o piso nacional para a categoria
Na terça-feira, dia 9, o gramado do Congresso Nacional foi tomado de vermelho. Bombeiros e policiais militares chegavam de todos os cantos do país para a manifestação marcada para as 14 horas. “O Corpo de Bombeiros, a Polícia Militar e a Polícia Civil pedem socorro, deputado. 35 anos de serviço prestado e a gente tem que mendigar um prato de comida, deputado?!”, exclamou, indignado, um bombeiro carioca.
Os trabalhadores tentaram ser recebidos pela liderança da Câmara para defender a aprovação da Proposta de Emenda Constitucional nº 300 (PEC 300), que estabelece um piso salarial nacional para bombeiros e policiais militares. Entretanto, não foram recebidos, entraram e acamparam na Casa. “Esse já é um espaço ocupado. Só saímos daqui com a votação”, avisou o cabo Benevenuto Daciolo, bombeiro do Rio de Janeiro e um dos líderes da mobilização.
A orientação do movimento aos que não puderam ir à Brasília era o aquartelamento. Só sair do quartel em emergências.
“A gente se sente enganado quando falam que não é possível pagar um salário digno para nós profissionais. Hoje eu estou aqui para mostrar uma coisa, que nós não somos heróis. Nós somos profissionais que salvamos vidas. Herói tem capa, armadura e superpoderes. E nós não temos isso. Nós só temos dignidade. Foi falado que seria impossível [uma reunião na terça-feira] porque todo mundo já foi embora. Mas nós sabemos que tem gasolina, tem dinheiro para terno, que tem recursos, que se fizer uma ligação agora todos [os deputados] vêm pra cá”, disse outro bombeiro.
“Os mais de dois mil militares que lá estão, entre BMs, PMs e policiais civis de diversos Estados do país, pernoitaram no Auditório Nereu Ramos, na Câmara dos Deputados, num clima de tranquilidade mas também de muita motivação”, informou o blog SOS Guarda Vidas, na quarta-feira pela manhã. E seguiu afirmando que “estamos em um momento crucial na busca pela nossa tão sonhada dignidade, alguns companheiros estão em Brasília desde ontem, alguns dormiram ao relento, outros dentro de um dos plenários da Câmara e com certeza outros nem dormiram”.
A mobilização nacional dos agentes da segurança pública é pela aprovação da Proposta de Emenda Constitucional nº 300, que estabelece um piso nacional que equipare os vencimentos das Policias Militares e Bombeiros Militares de todas as unidades da federação com os praticados hoje pelo Distrito Federal. A variação dos salários entre os Estados chega hoje a R$ 2.400,00, no caso dos bombeiros. Enquanto no Rio de Janeiro recebem um salário bruto inicial de R$ 1.031,00, no DF, o inicial é de R$ 3.453,70.
A PEC foi aprovada por unanimidade na Câmara, em primeiro turno, no ano passado, mas precisa ser reapreciada pelo Plenário. Para isso, tem que ser colocada em votação. Dos 12 líderes de partidos da Casa, 11 assinaram o documento pedindo que entre na pauta. Apenas o PT não assinou.
Os bombeiros foram recebidos somente na quarta-feira. E relataram, emocionados, aos deputados a situação da corporação: “É muito difícil ver um chefe de família ter que viver na minha condição. Eu sou filho de uma lavadeira. Estudei o pouco que podia e vim para o Corpo de Bombeiro há 21 anos atrás. Eu saio do quartel, depois de um serviço de 24 horas, fico 12 horas na minha casa, e fico mais 24 horas no Aeroporto Internacional de Cabo Frio. Eu sou bombeiro de aeródromo. E o restante da minha folga, eu passo no mar, no feriado, inverno, verão, matando peixe para sustentar a minha família. Porque o meu salário não me dá condição”. Com lágrimas nos olhos, o guarda vidas questionou os deputados: “Até quando a gente vai viver isso? Essa não é só a minha condição, é a condição de cada um que aqui está. Será que ninguém está vendo isso?”.
Pela proposta de calendário de votações apresentada à Câmara esta semana, a PEC não deverá ser votada até outubro deste ano.
Após considerar a pressão realizada pelos oficiais como “justa, legítima e democrática”, o presidente da casa, Marco Maia (PT), pediu que eles se retirassem do espaço “porque este não é o lugar apropriado para ficarem. Imagine se todos os trabalhadores que tenham demanda vierem para cá, seria incontrolável”. Colocando-se contra a votação “até que seja definida a origem dos recursos” para o aumento, Maia ouviu dos trabalhadores que os protestos continuarão.
Infelizmente, Maia seguiu a cartilha de Guido Mantega, de conter o orçamento com vistas a realizar superávit [ver matéria na página 3]. Segundo ele, “a crise financeira internacional exige cuidado e paciência, pois não permite gastos extras que comprometam a estabilidade econômica e fiscal do país”.
De acordo com os bombeiros a orientação dada à categoria é a de “aquartelamento” (onde os bombeiros só saem dos quartéis em casos de emergência).
“Vou mandar um recado aos governantes, de que vamos paralisar as obras da Copa com carros de som e com o apoio de sindicatos da construção civil. E a capital de manifestação já foi escolhida”, avisou o presidente da Confederação Brasileira de Trabalhadores Policiais Civis (Cobrapol), Jânio Bosco Gandra.
fonte:
http://www.horadopovo.com.br/2011/agosto/2984-12-08-2011/P4/pag4a.htm
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