terça-feira, 2 de agosto de 2011

Carta Manifesto da Marcha das Vadias de Rio de Janeiro – Por que marchamos?

No Rio de Janeiro, marchamos porque apenas nos primeiros três meses desse
ano foram 1.246 casos registrados de mulheres e meninas estupradas, uma
média de quatorze mulheres e meninas estupradas por dia, e sabemos que
ainda há várias mulheres e meninas abusadas cujos casos desconhecemos;
marchamos porque muitas de nós dependemos do precário sistema de
transporte público do Rio de Janeiro, que nos obriga a andar longas
distâncias sem qualquer segurança ou iluminação para proteger as várias
mulheres e meninas que são violentadas ao longo desses caminhos;
marchamos porque foi preciso a criação de vagões femininos no trem e no
metrô para que não fossemos sexualmente assediadas durante o uso desses
transportes

No Brasil, marchamos porque aproximadamente 15 mil mulheres são estupradaspor ano, e mesmo assim nossa sociedade acha graça quando um humorista faz piada sobre estupro, chegando ao cúmulo de dizer que homens que estupram mulheres feias não merecem cadeia, mas um abraço; marchamos porque nos colocam rebolativas e caladas como mero pano de fundo em programas de TV nas tardes de domingo e utilizam nossa imagem semi-nua para vender cerveja, vendendo a nós mesmas como mero objeto de prazer e consumo dos homens; marchamos porque vivemos em uma cultura patriarcal que aciona diversos dispositivos para reprimir a sexualidade da mulher, nos dividindo em “santas” e “putas”, e muitas mulheres que denunciam estupro são acusadas de terem procurado a violência pela forma como se comportam ou pela forma como estavam vestidas; marchamos porque a mesma sociedade que explora a publicização de nossos corpos voltada ao prazer masculino se escandaliza quando mostramos o seio em público para amamentar nossas filhas e filhos; marchamos porque durante séculos as mulheres negras escravizadas foram estupradas pelos senhores, porque hoje empregadas domésticas são estupradas pelos patrões e porque todas as mulheres, de todas as idades e classes sociais, sofreram ou sofrerão algum tipo de violência ao longo da vida, seja simbólica, psicológica, física ou sexual.


No mundo, marchamos porque desde muito novas somos ensinadas a sentir culpa e vergonha pela expressão de nossa sexualidade e a temer que homens invadam nossos corpos sem o nosso consentimento; marchamos porquemuitas de nós somos responsabilizadas pela possibilidade de sermos estupradas, quando são os homens que deveriam ser ensinados a não estuprar; marchamos porque mulheres lésbicas de vários países sofrem o chamado “estupro corretivo” por parte de homens que se acham no direito de puni-las para corrigir o que consideram um desvio sexual; marchamos porque ontem um pai abusou sexualmente de uma filha, porque hoje um marido violentou a esposa e, nesse momento, várias mulheres e meninas estão tendo seus corpos invadidos por homens aos quais elas não deram permissão para fazê-lo, e todas choramos porque sentimos que não podemosfazer nada por nossas irmãs agredidas e mortas diariamente. Mas podemos.

Já fomos chamadas de vadias porque usamos roupas curtas, já fomos chamadasde vadias porque transamos antes do casamento, já fomos chamadas de vadias por simplesmente dizer “não” a um homem, já fomos chamadas de vadias porque levantamos o tom de voz em uma discussão, já fomos chamadas de vadias porque andamos sozinhas à noite e fomos estupradas, já fomos chamadas de vadias porque ficamos bêbadas e sofremos estupro enquanto estávamos inconscientes, por um ou vários homens ao mesmo tempo, já fomos chamadas de vadias quando torturadas e curradas durante aDitadura Militar. Já fomos e somos diariamente chamadas de vadias apenas porque somos MULHERES.

Mas,hoje, marchamos para dizer que não aceitaremos palavras e ações utilizadas para nos agredir enquanto mulheres. Se, na nossa sociedade machista, algumas são consideradas vadias, TODAS NÓS SOMOS VADIAS. E somos todas santas, e somos todas fortes, e somos todas livres! Somos livres de rótulos, de estereótipos e de qualquer tentativa de opressão masculina à nossa vida,
à nossa sexualidade e aos nossos corpos.
Estar no comando de nossa vida sexual não significa que estamos nos abrindo para uma expectativa de violência, e por isso somos solidárias a todas as mulheres estupradas em qualquer circunstância, porque tiveram seus corpos invadidos, porque foram agredidas e humilhadas, tiveram sua dignidade destroçada e muitas vezes foram culpadas por isso. O direito auma vida livre de violência é um dos direitos mais básicos de toda mulher, e é pela garantia desse direito fundamental que marchamos hoje emarcharemos até que todas sejamos livres.

Somos todas as mulheres do mundo! Mães, filhas,avós, putas, santas, vadias…todas merecemos respeito!

Um comentário:

  1. Mulheres


    Mulheres, nós somos,

    inteiras, partidas,

    sofridas, sem sonhos,

    peritas na vida


    Mulheres, nós somos

    guerreiras, perdidas

    mantidas por donos,

    livres na vida


    Mulheres, nós somos

    queridas, contidas

    relevadas que fomos

    há tempos, na vida

    Mulheres, nós somos

    vividas, sentidas

    mas cheias de planos

    hoje, na vida.


    Ninféia G

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