sexta-feira, 24 de outubro de 2014

São decisões que não dão mais espera, Santos

Na raiz do escândalo que quiseram armar com a viagem de Timoshenko a Cuba em desenvolvimento do processo de paz que se adianta em Havana, um dos tantos colunistas dedicados profissionalmente a denegrir as FARC aventurava na semana passada que nós devíamos estar felizes, pois havíamos posto todo o país a brigar entre si, enquanto continuávamos obtendo interessados proveitos da existência da Mesa de Conversações.
De considerações desse tipo estão repletas as páginas da grande imprensa reacionária há mais de trinta anos, quando o Presidente Belisario Betancur abriu o processo de paz que não termina ainda com satisfações para a Colômbia. Ainda ecoa na memória de muitos a razão esgrimida pelo doutor Otto Morales Benítez ao renunciar a seu cargo de comissionado de paz do doutor Betancur. A paz contava com muitíssimos inimigos escondidos.
Isso continua sendo completamente certo. E os debates, diatribes e denúncias elevados contra o Presidente Santos confirmam-no plenamente. O desespero por arruinar os diálogos de Havana é enorme. O Presidente Santos deve saber algo que não se atreveu a dizer com relação a sua intenção de ensaiar a via política com a insurgência. De outra maneira, não se entende por que sua obstinada condescendência para com os que se lhe opõem frontalmente.
Hoje está suficientemente claro para o país e o mundo que o Presidente Uribe gestionou vários contatos com as FARC-EP com vistas a entabular conversações de paz. Inclusive Daniel Coronel revelou movimentos secretos de fundos encaminhados a facilitar esses contatos, coisa da qual nem nesses dias nem até agora nós tivemos a menor ideia. Personagens então de suas ligações, como Frank Pearl e outros, nessa época e nesta atuaram em gestões de paz.
Assim que alguém acreditaria que não deveriam existir razões nem para os receios de Santos nem para as raivosas atitudes adotadas pelos áulicos do Procurador Geral da Nação rebusca muito para afinar argumentos jurídicos contra as decisões políticas do Presidente Santos, ele mesmo ou qualquer outra autoridade competente poderia facilmente tecê-las contra o Presidente Uribe e os seus.
A via do diálogo, das conversações para solucionar pacificamente um conflito armado, trate-se da Colômbia ou de qualquer outro lugar, passa necessariamente pelo reconhecimento da existência do adversário e das aproximações a ele. Pela criação de condições que façam materialmente possível o intercâmbio de posições. Muito ao contrário de nossa proposta, o governo de Santos excluiu o território nacional como cenário. E houve que aceitar.
Sobre a base de que umas conversações a mais de dois mil quilômetros do país e com um oceano no meio exigiriam determinados mecanismos para sua viabilidade. Acreditamos relembrar que em algum momento o próprio Uribe promoveu denunciar Andrés Pastrana por conta de suas aproximações de paz com o Camarada Manuel Marulanda nos tempos do Caguán. Está visto que o ódio pode inspirar os maiores absurdos. As próprias circunstâncias impõem certos requisitos.
Santanderismos e leguleiadas caem por seu próprio peso quando o que se encontra no meio é o bem supremo da paz, um direito síntese dos povos que não lhes pode ser arrebatado sob nenhuma consideração. Por isso apoiamos todas as decisões do Presidente Santos quando queira que se atreve a dar passos contra condenar a Colômbia ao destino fatal de uma guerra sem fim. E acreditamos que todos os colombianos de boa vontade devem fazê-lo.
E por isso exigimos dele um compromisso mais decidido com o processo de paz de Havana. Em seus começos, vimo-lo francamente envergonhado, com desânimo, com indiferentes desejos de defender o que se adiantava na Mesa. Porém a possibilidade da reeleição pareceu torná-lo decidido finalmente a defender abertamente o que fazia. Por isso ganhou, porque obteve o respaldo do enorme caudal de compatriotas que sonha com uma Colômbia em paz para seus filhos.
Agora o vemos exageradamente emocionado, às vezes. Considerando tudo já de um cacho, dando por assentado que o Acordo Final é um fato. Ainda sabendo que estão pendentes discussões muito sérias, temas decisivos que o poriam na disjuntiva definitiva de eleger entre a paz para toda a nação ou a confrontação para a satisfação de uns poucos. Ainda assim, nos agrada mais esse Santos, comprometido publicamente com seu processo, chocando de frente com seus inimigos.
Promovendo o que chamam de pós-conflito. Buscando apoio externo político e financeiro para isso. O qual é bom, porém a todas as vistas insuficiente. Torna muito difícil entender como pode apresentar-se como paladino da reconciliação um Presidente que rechaça combinar um cessar-fogo que deteria o dessangramento dos filhos de sua pátria. E ademais só, sem a companhia de porta-vozes da insurgência que gerariam a seu lado a credibilidade necessária num acordo.
Que, ademais, conhecemos melhor que ninguém a real situação das zonas abandonadas pelo Estado em Colômbia, em cuja reabilitação em justiça estaríamos chamados a jogar, em conjunto com as comunidades, um papel importante. Porém se insiste por parte do governo nacional em escalonar e acelerar a confrontação em todo o país, com sua sequela de morte e horrores. E se continua nos negando com ênfase a possibilidade da menor atuação política interna ou externa.
O problema não está em que o senhor Uribe e o resto da catacumba se ponham bravos frente à possibilidade de avançar caminho para a paz. Eles estiveram bravos e fazendo a guerra sempre. A questão não é temer a suas reações, senão fazer a um lado e isolar suas posições extremas. E para isso é necessário romper definitivamente com eles. Apesar de ter se reeleito com a bandeira da paz, vencendo-os nas urnas, o Presidente continua sendo vacilante.
E por isso começa a afundar-se mais o interrogante do por que essa atitude dubitativa. No nosso caso, temos nossas próprias dificuldades, que não esquivamos, senão que afrontamos com a convicção absoluta no que estamos fazendo. Há gente, inclusive da que se faz chamar de esquerda, afirmando provocadoramente que o acordado nos três pontos até hoje constitui uma traição e uma renúncia a nossas bandeiras de luta. Isso não nos impede de seguir adiante.
Estamos certos de que a firma de um armistício que ponha fim aos enfrentamentos armados seria um passo gigantesco na construção da paz em Colômbia. E uma mensagem inequívoca ao mundo de que quando se fala das possibilidades de um pós-conflito se está expressando com suficiente propriedade. Muito mais se as duas partes proclamássemos conjuntamente. São decisões que não dão mais espera, Santos. Que fariam a todos acreditarem no processo de paz.
Timoleón Jiménez
Comandante do Estado-Maior Central das FARC-EP
Montanhas de Colômbia, outubro de 2014

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