segunda-feira, 22 de setembro de 2014

Desmobilizemos os ódios Escrito pelo Comandante Fabián Ramírez, Integrante da Delegação de Paz das FARC-EP

 
Setembro 2014. La Habana, Cuba


Em Colômbia existe um conflito social e armado, e deixou profundas feridas humanas, econômicas, políticas, culturais e sociais, por mais de cinco décadas. É inocultável este conflito, como também o são o sem-número de vítimas tanto na população civil como nas fileiras dos contendores. O dessangramento é evidente depois de mais de meio século de guerra em que como insurgência somos constantes na iniciativa do diálogo buscando resolver as causas objetivas da confrontação de maneira civilizada. As FARC-EP, por todos os meios possíveis, e procurando a participação de todos, militares, guerrilheiros e sobretudo o povo, temos buscado, e não nos cansaremos, de buscar uma saída acertada, sincera e real para acabar com esta guerra fratricida.

A chegada a Havana, Cuba, de uma equipe de militares ativos com sua única missão técnica de ver e buscar o desarmamento e a desmobilização da insurgência, e, como disse o ministro fanfarrão Pinzón, para que as FARC não aprontem uma armadilha ao país, é uma desfiguração do pactuado. Não se pode seguir dando pé para tergiversações ou más interpretações que logo se repetem para a população colombiana para desinformar e fazer a guerra suja e da propaganda contra insurgente.

As FARC-EP não são uma força guerrilheira derrotada, senão que uma força beligerante com perspectivas claras de poder que agora se empenharam com mais ênfase que nunca seu compromisso de buscar alternativas políticas à confrontação, fazendo exposições programáticas claras frente a assuntos de ordem econômica, política, cultural e social fundamentadas para que o país conquiste as transformações mínimas que abram as portas à democracia e à justiça sem necessidade de recorrer ao uso das armas, para que sejam reconhecidos os direitos das maiorias, e assim, então, entre todos mudemos o rumo equivocado no qual por mais de 50 anos a oligarquia teve a Colômbia.

Este é o sentido de cada iniciativa que se constrói em Havana, e dentro desta linha foi que se pactuou o estabelecimento da Comissão técnica para analisar o assunto da deixação de armas como via para atuar na vida política sem recorrer à violência. Porém, isto é tema que compromete as duas partes que estão sentadas na Mesa; quer dizer que isso implica também falar da desmilitarização do Estado e da sociedade.

Se com as FARC-EP o governo de Juan Manuel Santos, já faz dois anos, acordou uma agenda a seguir para que entre ambos e com a participação do povo buscássemos a saída incruenta a este conflito, pois, isto é o que há que fazer e não seguir sonhando com um esquema de submissão por parte da insurgência.

Este conflito colombiano não pode ser visto assim tão simplesmente. Se se demonstrou na história do país que as causas que o originaram continuam vigentes, e todos os dias se aprofundam mais, a solução não está em que uma guerrilha se desmobilize ou que os fuzis se silenciem; a chave está em que se desmobilize a fome, a desnutrição, a falta de educação, a falta de teto, a falta de trabalho, em que se desmobilize as detenções arbitrárias, as torturas, os desaparecimentos. Só assim, desmobilizando todos estes problemas que golpeiam aos colombianos, podemos dizer que os fuzis, por si sós, se silenciarão.

Já se conheceu que a equipe de militares profissionais, comandados pelo general Javier Flórez, que recentemente viajou a Cuba, chegaram para que se oficializasse sua presença na Mesa de Diálogos, e os guerrilheiros conscientes da importância e necessidade de uma breve solução a este conflito, lhes estendemos as mãos de homens e mulheres, que humildemente e sem nenhum interesse pessoal queremos o melhor para nosso país. Por isso lhes demos as boas-vindas para que, de uma vez por todas, desmobilizemos o mais rápido possível todos os problemas sociais que geraram e mantêm esta guerra.

Não se trata de preparar a um general, dois coronéis de exército, um capitão de fragata, um tenente-coronel da polícia, um major da força aérea, um tenente de navio e três advogados, todos com altos estudos e desempenho constante nas atividades da inteligência militar, para que busquem saídas exclusivamente para dois temas concretamente: a desmobilização da insurgência e a entrega de suas armas. Não. O que cremos é que estes altos militares estão em capacidade de entender e compreender que o principal para terminar com um conflito é a solução aos problemas que o originaram.

Não é uma desonra que estes altos oficiais cheguem a Havana e, num primeiro gesto de reconciliação, se deem as mãos com os guerrilheiros que estamos aqui em Cuba. Sabemos e vivemos em carne própria que estes oficiais buscaram por todos os meios possíveis assassinar-nos; porém, sem antes conhecer por que estamos lutando neste país. Cremos que, pelo contrário, deveríamos, os guerrilheiros, sentir-nos desprazerosamente saudando-nos cara a cara com o verdugo, porém não se trata de ver o problema de nossa pátria com sentido de vingança, senão que de vê-lo com desejos de verdadeira reconciliação; mais entre combatentes que vivemos pessoalmente os rigores da guerra.

Certamente saberemos compartilhar experiência e entender que o problema de sofrimento e dor a que nos tem submetido esta classe burguesa e corrupta que governa a Colômbia, é o mesmo sofrimento e submissão em que também estão imersos os militares que hoje nos combatem.

Sim, já é o momento para que generais, coronéis, brigadeiros, tenentes-coronéis, capitães, majores, tenentes, sargentos, cabos e soldados, junto com o povo e as FARC-EP componhamos o Comando Estratégico da “Transição” da fome, da miséria, do abandono..., para a igualdade, a humanidade, a reconciliação e a convivência; o que deve impor-se para sempre nesta Colômbia sofrida, submetida e explorada até alcançar um estágio de normalização.

A ideia equivocada da entrega de armas e a desmobilização não soluciona o conflito nem repara os danos causados por ele. Nenhuma das forças contendoras chegou à Mesa para capitular, a entregar as armas e a desmobilizar-se. O acordo de deixação da armas, como os demais acordos, se baseia na bilateralidade, acompanhado de passos prévios como a deixação dos costumes políticos que estimulam a guerra antipopular, passos como a desmilitarização da sociedade e do Estado, o desmonte do paramilitarismo, a democratização das Forças Armadas, o trânsito da Polícia Nacional para a missão que lhe corresponde, assim como outras medidas efetivas que promovam uma cultura política para a democracia, a reconciliação e a paz. Isto é, criar as condições materiais e espirituais para passar de um estado de guerra a uma situação de paz.
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Equipe ANNCOL - Brasil
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