Escrito
por Yira Castro, integrante da Delegação de Paz das FARC-EP
Por
ocasião do recebimento e das boas-vindas à primeira delegação de
vítimas do conflito, o segundo segmento do ciclo 27 de conversações
de Paz para Colômbia começou com uma sessão especial da Mesa de
Conversações de Havana.
Foi
uma recepção solene, respeitosa, muito aberta ao diálogo e a
encontrar os caminhos que conduzam à solução das origens, das
causas e dos efeitos da confrontação, com vistas a buscar a
reconciliação, o fim do conflito e a construção da Paz.
A
jornada desenvolvida no dia de ontem começou às 9 da manhã, hora
em que chegaram as vítimas ao Salão de Protocolo del Laguito.
Minutos antes, haviam-no feito os integrantes das delegações do
Governo e das FARC-EP, os quais se prepararam para receber os
visitantes. A sessão foi confidencial e se estendeu até às 15
horas. No meio da jornada, os assistentes destinaram tempo para
compartilhar um almoço-bufê num ambiente de total distensão.
O
encontro da delegação de vítimas do conflito com os meios de
comunicação em Havana
“As
flores significam memória, as flores significam esperança em que
este processo de Paz culmine”, disse uma das participantes ao lhe
perguntarem por que o recinto estava decorado com tantas flores.
Meios
internacionais como Al-Jazira, a Agência Reuters e TeleSUL, entre
outros, ademais dos meios nacionais como Caracol, o portal Las 2
Orillas e a equipe de imprensa das FARC-EP se fizeram presentes no
lugar que se adequou para a rodada de imprensa convocada pelos
organizadores para que as vítimas fossem ouvidas publicamente.
A
rodada de imprensa iniciou às 18:00 e teve lugar numa das salas do
Salão de Protocolo.
A
primeira intervenção foi feita pelo representante da Organização
das Nações Unidas em Colômbia, Fabrizio Hochschild, com a
apresentação de um comunicado redigido pelos organizadores do
encontro, uma síntese arrojada da reunião fechada entre as partes
com as vítimas.
Por
sua parte, as vítimas iniciaram sua intervenção com um comunicado,
o qual foi elaborado depois do encontro com as delegações das
FARC-EP e do Governo colombiano, segundo contaram.
No
comunicado lido a várias vozes, o primeiro grupo de vítimas do
conflito considera como um gesto de reconhecimento em favor da Paz,
da reconciliação e da garantia dos direitos das vítimas terem sido
convidadas a participar no encontro.
De
igual forma, apreciaram o esforço realizado por Nações Unidas,
Centro de Pensamento e Seguimento ao Diálogo da Universidade
Nacional, Conferência Episcopal Colombiana, pelos países
garantidores Noruega e Cuba, e os países acompanhantes Chile e
Venezuela, ao tempo em que ressaltaram a hospitalidade de Cuba como
país anfitrião.
Por
outro lado, deram fé de disporem de total liberdade no momento de
expressar suas experiências, explicações e propostas; também
deixaram claro que não pretendem representar o total das vítimas;
porém garantiram, sim, “terem compartilhado o compromisso pela
verdade como base da Paz”, disse uma delas.
A
comissão de vítimas do conflito social e armado fez um
reconhecimento às demais vítimas e as convidou a unir-se numa causa
comum. Ao mesmo tempo, manifestaram sua decisão de continuar
trabalhando arduamente para que todas sejam ouvidas; de igual
maneira, demandaram o acompanhamento da sociedade em seu conjunto na
reivindicação de seus direitos como vítimas e pela consecução da
Paz.
Também
exigiram das partes, dos meios de comunicação e dos demais
estamentos da sociedade envolvidos na solução do conflito o
respeito pela atividade que eles como vítimas vêm desenvolvendo; do
mesmo modo, exigiram garantias de segurança “evitando
tergiversações, infâmias e estigmatizações”.
A
comissão de vítimas celebrou o ambiente de respeito e a apreciação
de sua participação por parte das duas delegações, Governo e
FARC.
Finalmente,
disseram ficar à espera da materialização do compromisso
expressado pelas partes no sentido de estabelecer um mecanismo de
seguimento que dê respostas, ao mesmo tempo que faça efetiva a
materialização das diferentes propostas e explicações
apresentadas pelo grupo.
Rodada
de intercâmbio com os meios de comunicação
Uma
reflexão para os militares e o ministro de Defesa: “Umas forças
armadas defensoras dos Direitos Humanos não necessitam foro militar,
não têm nada que esconder. Estabelecer o foro militar é um
reconhecimento de que são vitimários”, disse uma das vítimas do
Estado.
Na
sessão de intercâmbio entre a comissão de vítimas do conflito e
os meios informativos, pudemos ver um grupo de pessoas conscientes da
urgente necessidade de que a sociedade assimile melhor o momento
histórico pelo qual atravessa o país e se envolva decididamente na
construção da Paz com Justiça Social como único meio de reparar
as injustiças geradoras da esteira de violência que tem golpeado a
Colômbia durante décadas.
Pessoas
respeitosas, propositivas e plenas de dignidade. Uma delas expressou:
“[...] Viemos com propostas, não só com dor... viemos com anseios
de verdade, de esclarecimento”. Deste modo, consideram fundamental
a criação da Comissão Histórica do Conflito e suas Vítimas.
“Em
virtude de que, infelizmente, a verdade tem sido uma das principais
afetadas em Colômbia, não só como consequência do conflito como
também pelo interesse de setores em particular da sociedade
colombiana por tergiversar a origem, as causas e as consequências do
mesmo, gerando um esquema de pensamento e de incompreensão funcional
à reprodução da guerra em Colômbia”, pontualizou um dos
participantes.
“Viemos
propor uma Subcomissão da Verdade sobre os Desaparecimentos
Forçados, que as partes nos digam onde estão as tumbas, as fossas
clandestinas, que nos digam o que fizeram com eles e elas”, disse
uma mulher com voz firme.
Todos
coincidem em que a dor das vítimas é uma só, seja qual seja o
ator, em que se estabeleça a verdade e a justiça real. Expressaram
também que existe uma possibilidade, ainda não explorada, de compor
um movimento único de vítimas como movimento social no país, o que
demandaria a firma de um acordo de Paz em Colômbia, “uma
democratização real que garanta a estes movimentos poder
manifestar-se sem ser reprimidos”.
Da
mesma maneira, insistem na unidade, já que “todas as mobilizações
dos trabalhadores, dos campesinos, dos afros, em Colômbia estão
repletas de vítimas... esta é uma muito boa oportunidade para que
neste espaço se reconheça o papel de organizações e movimentos de
vítimas que existem no país aos quais nós reconhecemos e
representamos”.
“Chegamos
com medo, com angústia, com frustração, porém vimos esse grande
afeto de parte deles em ouvir-nos, isso é um grande passo para
conquistar a paz. É um primeiro passo na forma como eles se
dirigiram para as vítimas”. “As vítimas somos o fundamento do
processo de paz em Colômbia, as vítimas somos visíveis, temos voz,
temos dignidade e fomos ouvidas de uma forma muito respeitosa. Vimos
um ato esperançador”, manifestaram.
Fica
claro que, ainda que as vítimas estão unidas pelo mesmo sentimento
de dor, que coincidem em que seu único anseio não é só encontrar
a verdade, mas também parar a violência em todas as suas
manifestações, cada um tem pontos de vista diferentes quanto ao
ressarcimento e a justiça que deve ser aplicada.
Este
foi um certame histórico.
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