sexta-feira, 9 de janeiro de 2015

‘2015 vai ser o ano da paz': Carlos Lozano

Por Juán Francisco Valbuena G.

Diretor do semanário 'Voz' diz que prepara um livro com intimidades dos diálogos.


Carlos Lozano, diretor do semanário de esquerda Voz e um dos homens que mais se aproximou do processo de paz desde seus inícios, dedicou estas últimas semanas a recompilar algumas intimidades dessas primeiras aproximações entre o Governo e as Farc, as quais publicará num livro que virá à luz antes de março.
Em meio a essas recordações, Lozano reservou um espaço para dialogar com EL TIEMPO e expor seus pontos de vista sobre o que se poderia esperar das negociações de Havana neste 2015.
Diz, por exemplo, que, se se chega ao final do conflito, é claro que as Farc têm que “deixar as armas” e não podem fazer política com elas, e que, se neste ano há acordo sobre vítimas, o processo chegará a um ponto “irreversível”.
Como vai seu livro sobre os diálogos de Havana?
Bem. Quero contar algumas coisas que não são conhecidas sobre como foram as primeiras aproximações e espero publicá-lo antes de março.
Como vê o momento atual do processo de paz?
Vejo-o num bom ponto, ainda que todavia não [esteja] no momento da irreversibilidade. Penso que ainda há que cuidá-lo muito, e, evidentemente, pedir que tanto o Governo Nacional como a guerrilha das Farc ponham todo o seu empenho para que continuem construindo o caminho da paz estável e duradoura. Creio que 2014 nos deixa um bom saldo com todos os acordos parciais que foram conquistados e que já são conhecidos, e que estamos num bom ponto para disparar no novo ano. Há razões para sermos otimistas em que 2015 vai ser o ano da paz.
Que tanto afetou a confiança das partes o sequestro do general Alzate e a suspensão dos diálogos?
Creio que foi um mal precedente. Foi negativo ter suspenso os diálogos pela situação trágica do general Alzate. Essa foi uma decisão que se tomou sob uma enorme pressão da extrema-direita. Esse incidente tinha que ser resolvido, evidentemente, porém não sobre a base de pôr em perigo o processo de paz. Isto afetou a confiança e é o que há que tratar de reconstruir, porém penso que com os resultados do ano passado há razões para crer que começamos 2015 recobrando essa confiança perdida.
Este tipo de incidentes deve ser separado do desenvolvimento dos diálogos?
O que creio é que chegou o momento da trégua, do cessar-fogo e das hostilidades bilateral. Creio que as Farc tomaram a iniciativa com o declaratório de uma trégua unilateral e por tempo indeterminado, o qual é altamente positivo, porém que vai ter sempre um risco e é que a contraparte não fez um gesto correspondente e isto faz com que esse cessar-fogo unilateral seja frágil. Isto salvaria o processo destes ruídos da guerra.
Há aqueles que pensam que o proposto pelas Farc, de não atacar sempre e quando não as ataquem, é tratar de levar o Governo a um cessar-bilateral, que você opina?
Não creio que seja uma pressão, é simplesmente pôr o ponto onde é. As Farc estão dizendo que estão dispostas a um cessar-fogo unilateral e por tempo indeterminado, porém que também esperam que se lhes respeite porque, se não, isto se converteria –há que dizê-lo assim- numa vantagem para a Força Pública desde o ponto de vista militar.
Que temas há pendentes no processo para este ano?
Basicamente, são três. Já está praticamente resolvida a parte de discussão sobre vítimas. Se ouviu 60 delas, que, mesmo que não representam a todo o universo de afetados pelo conflito, sim a um setor muito importante deste. Falta agora a discussão para chegar a uns acordos nesse tema e creio que o abordarão em janeiro.
Qual é o segundo?
O assunto do fim do conflito, que tem uma série de elementos importantes, como a deixação de armas, componente militar, garantias para a guerrilha e como se vai resolver o conflito desde o ponto de vista jurídico, porque este é um tema político e jurídico.
E o terceiro?
Finalmente, ficaria o ponto de como se vão ratificar e implementar os acordos, no qual há diversas propostas. Creio que, chegando a um acordo quanto às vítimas e do que disso se derivaria, se poderia chegar ao ponto da irreversibilidade.
Por que é tão otimista?
Porque creio que neste ano é quando se poderá chegar aos acordos sobre os pontos que faltam [vítimas, fim do conflito e referenda] e também sobre outros que ainda estão pendentes. Se há acordo sobre estes temas, creio que o caminho ficaria liberado para um pacto final, o qual não necessariamente se daria daqui a outubro ou novembro de 2015, pode ser começando em 2016, não me atrevo a falar de tempos, porém creio, sim, que este ano será decisivo.
Deve haver deixação ou entrega de armas por parte das Farc?
Nesse tema há algo de fundo. O Governo e as Farc firmaram –no acordo de Havana- acolher o conceito de deixação de armas. A entrega de armas significa a derrota de quem as está entregando, a claudicação, e creio que esse não foi o sentido do diálogo de Cuba. O próprio Governo falou desde um princípio de uma paz digna e com respeito: digna para a guerrilha e para o Estado; falou também de que não houvesse nenhum tipo de vantagem para nenhuma das partes e por isso se escolheu o conceito de deixação de armas, que implica que as Farc não vão mantê-las nem que continuarão atuando na política, depois de firmada a paz, com elas nas mãos.
E que opções há para a deixação das armas?
Isso deve ser decidido pelas partes, que caminho as armas vão tomar, se se vão lançar ao mar, se se vão entregar a um terceiro país, se se vão afundá-las, enfim; são as partes que vão combinar, a acordar o que fazer com as armas, uma vez que se firme o fim do conflito, porém é evidente que estas têm que desaparecer, uma vez que haja um acordo de paz estável e duradoura.
‘Presença de ‘Gómez’ imprimirá peso ao processo?
Que opinião tem da chegada de ‘Joaquín Gómez’ a Havana?
É muito importante pelo que ele significa nas Farc. É um de seus comandantes mais veteranos e jogou um papel muito destacado nos diálogos de El Caguán. Creio que sua presença imprime peso e dinamismo ao processo, como a de outros membros do secretariado. Ademais, creio que, de uma vez por todas, ficam desvirtuados os rumores de certos analistas no sentido de que ‘Joaquín Gómez’ era o grande inimigo dos diálogos e que estava em rebeldia. Já hoje, ‘Joaquín Gómez’ é um protagonista dos diálogos, revela que há coesão nas Farc e que todos estão comprometidos. Isso tem que dar confiança e segurança ao país, no sentido de que os acordos aos quais se chegue em Cuba vão ser cumpridos pela absoluta maioria dessa guerrilha.
‘Joaquín Gómez’ pode significar a aproximação ao processo de uma ala das Farc que está relacionada com o narcotráfico?
Essa é outra fábula, a das Farc narcotraficante e cartel. Os próprios porta-vozes da guerrilha têm explicado este assunto e seu vínculo com este tema. O que tem ocorrido é que, devido ao fato de que esse fenômeno tem sido uma realidade em zonas onde as Farc estão, elas intervieram para cobrar um imposto e dar umas licenças, e que esse dinheiro lhes sirva para sua sustentação. Não vou entrar a qualificar se isso está bem ou está mal, porém, o que, sim, quero que fique claro é que, desde meu ponto de vista, há que deixar de insistir em que as Farc são narcotraficantes, até o ponto de que o próprio Governo disse que está estudando a possibilidade de que isto se considere um delito conexo com o delito político, à rebelião, que creio que é o mais pertinente.
Com a chegada de ‘Joaquín Gómez’, todo o secretariado passou por lá, que opinião, de sua parte, merece esse fato?
Isto significa que todo o secretariado das Farc está comprometido com a paz, que a decisão de adiantar o diálogo foi tomada por toda essa insistência e, de alguma maneira, foi a melhor homenagem que fizeram a ‘Alfonso Cano’, quem iniciou esses primeiros contatos com o Governo em segredo, e que, a pesar de sua morte, seus herdeiros na direção desta organização mantiveram essa política.
Equipe ANNCOL – Brasil

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