Por
Horacio Duque Giraldo
Um velho
axioma das gramáticas políticas sugere que a guerra é a
continuação da política por outros meios. Porém, o apotegma não
propõe eliminar o exercício do diálogo e dos acordos que
caracterizam essa velha atividade humana que implica a relação
civil entre as pessoas para resolver os conflitos e a infinidade de
problemas que surgem nas sociedades.
Os únicos
que têm tido essa pretensão são os seguidores do neoliberalismo
que sempre quiseram substituir a política pela competição e pelos
mercados. Seu ideal é subordinar a democracia aos ditames do
mercado, dos preços, dos lucros e das lógicas bélicas.
A guerra
em Colômbia está chegando a seu fim. A paz é, a cada dia, uma
realidade irreversível. É o reflexo da preponderância dos códigos,
argumentos e símbolos da política. A mais recente expressão desta
tendência são as decisões tomadas pelas partes plenipotenciárias
para baixar a intensidade do conflito e dessa maneira chegar a um
cessar-fogo e de hostilidades bilateral, no médio prazo.
Depois da
determinação das FARC de adiantar um cessar-fogo e de hostilidades
unilateral e por tempo indeterminado, o governo do Presidente Juan
Manuel Santos projetou atos recíprocos para deter as operações
militares ofensivas. (http://bit.ly/1IqkXre)
Em grande
medida, tudo é consequência do trabalho adiantado por uma
subcomissão integrada por oficiais das forças militares e delegados
das Farc, que debatem os detalhes do “fim do conflito” armado,
pois há que considerar, como expõem os expertos, que os aspectos
desta matéria, tanto no jurídico e no militar, corresponde ser
definido por técnicos especializados. Simplesmente, se trata de
resolver o problema que expõe como, quando, onde e através de que
mecanismos se pode levar a cabo a integração dos combatentes à
luta política. (http://bit.ly/1xRtUXO)
Essa não
é uma tarefa fácil. Se requer conhecer o território, a realidade
da confrontação, a distribuição de aparatos armados, os
mecanismos de controle e verificação das decisões, os corredores
de segurança, os canais de comunicação e coordenação, a
participação da comunidade internacional, as medidas de proteção
a serem adotadas para os desmobilizados, se existirão zonas de
concentração, o registro e a destruição de armas, as crianças
recrutadas, a informação relacionada com campos minados, as redes
de finanças, o suporte logístico, enfim, uma longa lista de
questões que exigem a expertise
dos membros das forças armadas e da guerrilha.
(http://bit.ly/1xRtUXO)
Colocados
neste plano concreto do debate, a pregunta que resulta adequado
formular-se é a seguinte:
O que é
desescalar o conflito e em que consiste o mesmo?
Desescalar
o conflito não seria outra coisa que o governo e as Farc decidirem
de comum acordo dar cumprimento estrito às leis da guerra: ao
estatuto de combatentes, aplicação rigorosa do Direito
Internacional Humanitário e da salvaguarda e aplicação dos
Direitos Humanos, entre outras possibilidades do direito
internacional, aplicado ao contexto e as realidades do conflito
armado colombiano. (http://bit.ly/1xRPONJ)
Nesse
sentido, a desescalada da confrontação seria um conjunto de ações
muito concretas que gradualmente devem ir se implementando.
Inicialmente,
se sugeriu por alguns expertos na matéria que a Força Pública pode
deixar de utilizar certo tipo de artilharia, como morteiros ou bombas
de fragmentação e assaltos aéreos aos acampamentos guerrilheiros.
Isto tem a ver com usar medidas de fogo de menor proporcionalidade
ou, inclusive, indo mais além: decidir não adiantar operações
ofensivas contra objetivos de alto valor da guerrilha.
(http://bit.ly/1IqkXre)
Outros
formularam um quadro sistemático de medidas que baixem a intensidade
do conflito e que, na sua opinião, devem debater-se sem preconceitos
e com o interesse de ampliar os detalhes da desescalada do conflito.
(http://bit.ly/1xRPONJ)
Essas
medidas insinuadas são as seguintes:
- Estabelecer uma precisa distinção entre combatentes e não combatentes, entre combatentes e população civil, um compromisso de salvaguarda da vida e dos bens da população civil, da vida e da integridade dos combatentes que em meio à confrontação fiquem em condições de indefensabilidade, a não execução, nem prática de tortura e o reconhecimento pleno de seus direitos nas melhores condições possíveis. Não incorrer, sob nenhuma circunstância, em práticas de torturas ou tratos cruéis, inumanos ou degradantes.
- Fazer uso da força tendo como critérios absoluta necessidade e proporcionalidade.
- Diminuir nos territórios e povoados o uso desproporcionado das armas convencionais [bombardeios e metralhamentos] e não convencionais [cilindros, bombas ou tatucos, minas] e não empregar métodos ou meios de combate cujos efeitos não é possível limitar de conformidade com o prescrito ou que estão proscritos dos usos e costumes da guerra. Não empregar métodos ou meios de combate que não podem dirigir-se contra um objetivo militar concreto. Nem empregar métodos ou meios de combate cujos efeitos não seja possível limitar.
- Não realizar ataques indiscriminados, como parte de uma estratégia de semear terror na população civil. Não fazer padecer de fome as pessoas civis como método de combate. Nem atacar, destruir, subtrair ou inutilizar os bens indispensáveis para a sobrevivência da população civil. Nem utilizar o bloqueio ou o assédio como método de combate contra a população civil. Não atacar as obras ou instalações que contêm forças perigosas, a saber: as represas, os diques, torres de energia elétrica, gasodutos.
- Acordar processos de desminado que afetam a população civil e do uso de todo tipo de artefatos explosivos que podem ocasionar mortes, lesões físicas, mutilações ou afetações de tipo mental, psicossocial e econômicas à população civil.
- Suspender o ataque à infraestrutura estratégica do país. Frear a tomada violenta de povoados.
- Não ocupar escolas, nem igrejas, nem fazer uso indevido da missão médica. Nem incorrer em ocupação, destruição, inutilização, ou qualquer outra forma de causar dano a instituições educativas, religiosas ou de saúde para destruir parcial ou totalmente os lugares, causar mortes ou dano à população civil e a funcionários, ou semear temor entre eles. Igualmente, não interferir no normal funcionamento das instalações nem utilizá-las como albergue ou para fazer campanhas e distribuir propaganda.
- Nem incorrer em execuções extrajudiciais, nem em detenções-sequestro, desaparecimentos, nem retenções ou capturas. Não utilizar retidos como reféns. Libertar os sequestrados incondicionalmente e de maneira imediata, os prisioneiros de guerra e presos políticos que se encontrem em condições críticas de saúde e que não representem nenhum perigo para a sociedade.
- Garantir aos presos políticos e aos prisioneiros de guerra o exercício de seus direitos. Não mantê-los incomunicáveis, isolados e em risco, nem incorrer em tratos cruéis, inumanos e degradantes.
- Oferecer todas as condições para que se garanta o devido processo tomando em consideração aspectos como: Informar ao acusado sobre os detalhes da infração que se lhe atribui. Garantir ao acusado, nas atuações que precedam ao julgamento e no curso deste, todos os direitos e meios de defesa necessários. Condená-lo por uma infração com fundamentos diferentes dos da responsabilidade penal individual. Condenar uma pessoa por atos ou omissões que, no momento em que foram cometidos, não foram delituosos segundo o direito. Impor ao condenado uma pena mais grave que a aplicável no momento de cometer-se a infração e com premeditação por sua condição política ou ideológica. Impedir que o condenado se beneficie de uma pena mais leve se, posteriormente à comissão da infração, a lei a dispusera. Não presumir a inocência de uma pessoa acusada ou presumir sua culpabilidade sem provas obtidas conforme a lei. Impedir que a pessoa acusada se encontre presente no momento de ser julgada. Obrigar a pessoa acusada a declarar contra si mesma ou a se confessar culpada.
- Não incorrer em práticas de recrutamento forçado da população, nem de meninos nem meninas e adolescentes [MMA]. Extrair os menores das ações militares. Não utilizar MMA como combatentes, cozinheiros, vigias, mensageiros, espiões ou informantes ou para propósitos sexuais. Esta violação inclui a participação de MMA em atividades pontuais, como trabalhos de inteligência, independentemente de que façam parte regular ou não de um grupo armado ou das forças armadas.
- Não envolver a população na guerra [informantes], nem fustigá-la para dela arrancar informação sobre o inimigo.
- Não propiciar deslocamento forçado de pessoas ou grupos de pessoas, não apropriar-se de seus pertences, nem gerar atos de violência generalizados. Opor-se às formas do despojo e da expulsão de moradores. Não instalar barreiras, nem exercer controle sobre o abastecimento. Permitir a livre circulação dos moradores. Não destruir casas, colheitas, nem animais.
- Não incorrer em práticas de agressão sexual contra as mulheres, o que inclui violação, escravidão sexual, prostituição forçada, gravidez forçada, esterilização forçada ou qualquer outra forma de violência sexual de gravidade comparável.
- Evitar as práticas de discriminação racial contra combatentes e população civil que conduzem ao exercício da violência e à violação de direitos fundamentais.
- Respeitar os territórios, as populações indígenas e afrocolombianas, sua cultura, sua organização social e política, o exercício de sua autonomia sobre seus territórios. Ademais de considerar a categoria de grupos étnicos, é necessário incluir outros grupos como partidos políticos, população LGBTI, jornalistas, sindicalistas, entre outros.
- Respeitar o direito à mobilização e ao protesto pacífico dos moradores das regiões, assim como dos campesinos, trabalhadores, ambientalistas, mulheres, defensores de direitos humanos, jovens, indígenas, comunidades afrodescendentes, estudantes e em geral de todas as formas organizadas da sociedade civil.
Fazer um
mapa de desescalada, dando prioridade às regiões mais açoitadas
pela guerra e pela violência, envolver os governos locais e
estaduais, utilizar o acompanhamento internacional, presença de
organismos como Defensoria do Povo, Nações Unidas, Cruz Vermelha
Internacional, redes e vedorias cidadãs de paz, entre outras
possíveis instituições e formas de organização cidadã.
(http://bit.ly/1xRPONJ)
É
igualmente necessário que o governo e as FARC-EP pensem
conjuntamente que medidas podem ser implementadas nas regiões para
combater o paramilitarismo e os prolíferos Bandos Criminais.
É
mentira, como o afirma a ultra direita uribista para manipular a
cidadania, que uma desescalada do conflito e um cessar-fogo bilateral
implique que o Estado deixe de cumprir suas funções
constitucionais. As Forças Militares devem continuar cumprindo com
suas obrigações constitucionais, sobretudo de defender as
fronteiras e a soberania, sem agredir violentamente os territórios e
seus povoados como estão fazendo hoje alguns militares
irresponsáveis em certos lugares do Meta [Macarena e La Uribe],
Antioquia [Nudo del Paramillo], Cauca [Toribio], Nariño, Chocó,
Caquetá, Putumayo, Bolívar e no Catatumbo.
Outro
aspecto que é necessário considerar neste debate sobre a
desescalada é o tema do paramilitarismo. O certo é que o
neoparamilitarismo anda como Pedro por sua casa e os Bandos criminais
administram territórios com o visto bom da polícia e das brigadas
militares. Em Bogotá, o paramilitarismo se move muito folgadamente
nas Localidades de Bosa, Soacha, Ciudad Bolívar, Kennedy e Usme. Em
Cucutá, os Usugas são os donos da cidade e da fronteira contando
com a cumplicidade oficial.
Nota: O
Prefeito de Bogotá, Gustavo Petro, e seu círculo de áulicos está
utilizando o tema da paz para oxigenar-se politicamente. É a mostra
de seu costumeiro cinismo e oportunismo político, depois de ter, ao
longo dos governos de Uribe e Santos, pressionado para a extradição
dos líderes da guerrilha para os cárceres norte-americanos e que
comemorou exasperadamente os casos infames de Simón Trinidad e
Sonia, hoje condenados a longas penas em prisões gringas.
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Equipe
ANNCOL - Brasil
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