sábado, 8 de novembro de 2014

Saudação das FARC-EP à quarta audiência de vítimas do conflito

Ao quarto grupo de vítimas do conflito nesta audiência de Havana, nosso afeto e saudação de boas-vindas. Destacamos seu compromisso com a paz da Colômbia manifestado na determinação de acorrer a este cenário de diálogos com seus depoimentos de dor e sentimento de reconciliação.
Também expressamos nossa saudação aos garantidores de Cuba e da Noruega, aos representantes de Venezuela e Chile que têm sido acompanhantes abnegados deste esforço pela paz, que é o mais elevado dos direitos que o nosso povo merece.
Estendemos também uma saudação cordial à Delegação governamental e aos organizadores deste certame.
Infelizmente, continua presente a circunstância de que nem todas as vítimas são iguais ante o Estado. Por isso, de maneira incompreensível, vemos que o Governo nacional não outorgou as autorizações necessárias para que o rebelde bolivariano Tulio Murillo marcasse presença como prisioneiro de guerra e vítima num evento como este, em prol da justiça, requer da voz viva dos que nas prisões da Colômbia padecem de toda classe de humilhações e violações a seus direitos fundamentais.
Essa cadeira vazia, que deveria estar sendo ocupada por nosso companheiro Alonso, se erige num monumento à intransigência em meio a um processo de paz que se supõe está concebido para dar mostras de tolerância e equilíbrio, sem exclusões nem estigmatizações que aprofundem as feridas que a guerra deixou. Tal circunstância agrava, sem dúvida, as indignas e inumanas condições em que sobrevivem os presos políticos, os prisioneiros de guerra, e em geral a população reclusa nos infernos degradantes que são os centros penitenciários de nosso país.
Esta situação infamante parece não inquietar ao Estado que os priva da liberdade, e por isso complementa suas ignomínias negando-lhes o direito a receber solidariedade, pois ocorre que mais de 90 integrantes de agrupações sociais comprometidas com a paz e os direitos humanos receberam ameaças de morte por grupos paramilitares, desde que começaram as audiências de Havana, tornando-se mais terrível a odisseia que desde sempre sofreram aqueles que com valentia se atreveram a defender aos que são perseguidos por opor-se ao regime de injustiça que impera em Colômbia.
Entre os ameaçados, se encontram também várias das vítimas do conflito que viajaram a Havana, como Alfonso Mora e Janeth Bautista. Hoje em dia, quase dois meses depois de se iniciarem as ameaças, estas não cessaram nem se produziu nenhuma posta à disposição da justiça de seus responsáveis, situação que, sem dúvida, preocupa sobremaneira a todo o povo colombiano.
Enquanto isso, aumentam as queixas dos líderes sociais e dos defensores de Direitos Humanos pelas falhas, deficiências e recortes orçamentários nos esquemas de proteção que são responsabilidade da Unidade Nacional de Proteção, pelos riscos e consequências negativas na segurança provocados por estes recortes. No mês de outubro de 2014, inclusive a Defensoria do Povo veio registrando este aumento de queixas por parte de vários líderes sociais em relação com os esquemas de proteção que lhes foram destinados, e de maneira particular a respeito da falta de recursos para sua mobilização, o que, sem dúvida, os torna a cada dia mais ineficazes.
São muitas as queixas postas em conhecimento da Unidade Nacional de Proteção por defensores de direitos humanos, jornalistas, vítimas do conflito armado, reclamantes de terras, sindicalistas, entre outros, com a finalidade de que se tomem as medidas pertinentes para evitar maiores riscos para a vida e integridade dos ameaçados. Pedimos contundentemente que de imediato se realizem os necessários esforços orçamentários para sanar estas deficiências, porque nada há mais valioso que a vida de qualquer compatriota, e o referido objetivo deve ser a maior das prioridades orçamentárias.
Por outra parte, é obrigado mostra nossa preocupação e dor pela continuação de assassinatos de sindicalistas colombianos. Em menos de dois meses se produziram dois novos crimes. Nesta ocasião manifestamos nossa condenação pelo crime contra o líder e dirigente comunitário Nelson Medina Ortega, quem foi assassinado na última noite da sexta-feira 17 de outubro em Villavicencio. Medina Ortega era presidente da ARCA, Associação de Regiões da Área Circunvizinha de Apiay. Este fato se soma ao ocorrido no último mês de agosto, quando foi assassinada Edith Santos, quem era fiscal do Sindicato Nacional de Profissionais de Seguridade, Sinproseg, e presidenta da Corporação de Juntas de Ação Comunal de Castilla-Chichimene, também no Meta.
As audiências de Vítimas não devem se constituir num simples exercício de exposição da dor causada pelo conflito armado em Colômbia. Estamos obrigados a atuar adotando medidas imediatas que evitem a geração de novas vítimas. E nesta mesma linha de ideias acreditamos que o Estado não pode continuar negando-se a reconhecer ante a CIDH ou ante qualquer outra instância sua responsabilidade pelo extermínio da UP, nem negar-se a reparar o dano causado por este grave caso de vitimização coletiva por motivos políticos, que não tem antecedentes em todo o hemisfério ocidental. Por isso, hoje, de maneira especial, mostramos nossa consternação pela atual negativa do Estado a reconhecer ante a CIDH sua responsabilidade no caso do desaparecimento forçado, em 1984, de Miguel Ángel Díaz, ativista do Cartido Comunista Colombiano [PCC].
A 5 de setembro de 1984, Miguel Ángel Díaz e Faustino López Guerrero, dirigente agrário, se dirigiram a Puerto Boyacá para realizar atuações de índole política. Na saída de um escritório da administração pública, Miguel Ángel foi introduzido à força num veículo, e horas mais tarde Faustino López também foi retido por pessoas desconhecidas. Os dois permanecem desaparecidos desde então.
Em 29 de maio de 1986, o Tribunal Primeiro Penal do Circuito de Tunja condenou o agente do Departamento Administrativo de Segurança [DAS], Jorge Luis Barrero, por estes atos. No entanto, este funcionário do DAS foi condenado somente a cinco anos de prisão na qualidade de coautor. O agente do DAS nunca revelou o paradeiro de Miguel Ángel Díaz nem de Faustino López, nem os nomes dos demais autores dos desaparecimentos. No processo de investigação se identificaram outros supostos responsáveis que se negaram a declarar ou não foram investigados, a maioria deles membros de organismos de segurança do Estado, funcionários e membros de grupos paramilitares. O processo penal se adiantou em Tunja porque em Puerto Boyacá, epicentro e escola do paramilitarismo, não havia garantias para a investigação, pelo contrário, os investigadores também foram ameaçados, como está consignado numa constância da Procuradoria.
A 16 de dezembro de 1993, a Corporação Reiniciar pôs à Comissão Interamericana de Direitos Humanos [CIDH] em conhecimento das graves violações de direitos humanos das quais foram vítimas os membros da União Patriótica desde a metade da década dos ’80. Em 12 de março de 1997 a CIDH proferiu o Informe Nº 11.227 sobre a admissibilidade do caso de Miguel Ángel. A 24 de março de 2000 se compôs uma mesa para a solução amistosa do caso; porém, em junho de 2006 as organizações peticionárias decidiram abandonar esta via, como conseqüência dos reiterados descumprimentos do governo nos compromissos adquiridos nesta etapa. Miguel Ángel faz parte do processo, que continua ainda na Comissão Interamericana, negando-se o Estado a reconhecer sua responsabilidade neste e em muitos outros casos.
“O Governo nega as vítimas da União Patriótica e nega sua responsabilidade no extermínio. [...] Exigimos que nos reconheçam ante a CIDH”, disse recentemente a Presidenta da UP Ainda Avella, ela mesma vítima do extermínio dessa força política.
Como disse Avella, a assunção de responsabilidades por parte do Estado colombiano contribuiria de maneira determinante para a paz. Pedimos que a dita assunção de responsabilidades se faça de imediato e de forma concreta e explícita em todos os casos de evidente responsabilidade de agentes do Estado.
É indispensável que o Estado modifique sua conduta frente ao genocídio da União Patriótica e que contribua para esclarecer os fatos e identificar os responsáveis pela perseguição a esse movimento político, que continua sendo vitimizado.
Todos estes crimes foram cometidos entre os anos 1986 e 1996, período do genocídio contra a UP; porém, ao declarar-se de lesa-humanidade unicamente 34 casos, só se evitará que prescrevam esses, porque, na maioria deles, transcorreram cerca de 25 anos desde sua representação. O tempo urge e torna urgente um claro compromisso do Estado com a Verdade, a justiça, a reparação e a não repetição. O extermínio da UP não tem segredos. Em palavras do vice-fiscal geral, Jorge Fernando Perdomo: “se conseguiu determinar que se trata de ataques cometidos por grupos paramilitares, em alguns casos, em associação com agentes do Estado”, enquanto se ignoram pelo menos 3.000 casos, o grosso do genocídio cometido, apesar de que o vice-fiscal reconhece que estes atentados tiveram um caráter “generalizado, sistemático e reiterado contra a população civil”. Recordemos que a Comissão Interamericana de Direitos Humanos [CIDH] reconheceu como “extermínio político” esse assassinato de milhares de seus militantes.
Novamente queremos manifestar que as FARC-EP, em seu interesse por reivindicar as vítimas do conflito, apresentaram 10 propostas mínimas com desenvolvimentos específicos representados em pelo menos 50 iniciativas e linhas orientadoras que contemplam soluções práticas para o reconhecimento de seus direitos, o esclarecimento da verdade e seu ressarcimento integral.
Reiteramos ante vocês nosso compromisso explícito com o Direito Internacional dos Direitos Humanos e o Direito Internacional Humanitário, tendo em conta as particularidades dos conflitos armados internos, do conflito colombiano e a existência de uma juridicidade guerrilheira, que sempre aplicamos consequentemente adotando medidas sancionadoras contra aqueles que foram responsáveis por ações indevidas.
Novamente, lhes damos um caloroso abraço de boas-vindas a todos e todas, com a certeza de que sua contribuição será fundamental para a construção de um acordo final de paz.
Delegação de paz das FARC-EP
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Equipe ANNCOL - Brasil

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