Ao
quarto grupo de vítimas do conflito nesta audiência de Havana,
nosso afeto e saudação de boas-vindas. Destacamos seu compromisso
com a paz da Colômbia manifestado na determinação de acorrer a
este cenário de diálogos com seus depoimentos de dor e sentimento
de reconciliação.
Também
expressamos nossa saudação aos garantidores de Cuba e da Noruega,
aos representantes de Venezuela e Chile que têm sido acompanhantes
abnegados deste esforço pela paz, que é o mais elevado dos direitos
que o nosso povo merece.
Estendemos
também uma saudação cordial à Delegação governamental e aos
organizadores deste certame.
Infelizmente,
continua presente a circunstância de que nem todas as vítimas são
iguais ante o Estado. Por isso, de maneira incompreensível, vemos
que o Governo nacional não outorgou as autorizações necessárias
para que o rebelde bolivariano Tulio Murillo marcasse presença como
prisioneiro de guerra e vítima num evento como este, em prol da
justiça, requer da voz viva dos que nas prisões da Colômbia
padecem de toda classe de humilhações e violações a seus direitos
fundamentais.
Essa
cadeira vazia, que deveria estar sendo ocupada por nosso companheiro
Alonso, se erige num monumento à intransigência em meio a um
processo de paz que se supõe está concebido para dar mostras de
tolerância e equilíbrio, sem exclusões nem estigmatizações que
aprofundem as feridas que a guerra deixou. Tal circunstância agrava,
sem dúvida, as indignas e inumanas condições em que sobrevivem os
presos políticos, os prisioneiros de guerra, e em geral a população
reclusa nos infernos degradantes que são os centros penitenciários
de nosso país.
Esta
situação infamante parece não inquietar ao Estado que os priva da
liberdade, e por isso complementa suas ignomínias negando-lhes o
direito a receber solidariedade, pois ocorre que mais de 90
integrantes de agrupações sociais comprometidas com a paz e os
direitos humanos receberam ameaças de morte por grupos
paramilitares, desde que começaram as audiências de Havana,
tornando-se mais terrível a odisseia que desde sempre sofreram
aqueles que com valentia se atreveram a defender aos que são
perseguidos por opor-se ao regime de injustiça que impera em
Colômbia.
Entre
os ameaçados, se encontram também várias das vítimas do conflito
que viajaram a Havana, como Alfonso Mora e Janeth Bautista. Hoje em
dia, quase dois meses depois de se iniciarem as ameaças, estas não
cessaram nem se produziu nenhuma posta à disposição da justiça de
seus responsáveis, situação que, sem dúvida, preocupa
sobremaneira a todo o povo colombiano.
Enquanto
isso, aumentam as queixas dos líderes sociais e dos defensores de
Direitos Humanos pelas falhas, deficiências e recortes orçamentários
nos esquemas de proteção que são responsabilidade da Unidade
Nacional de Proteção, pelos riscos e consequências negativas na
segurança provocados por estes recortes. No mês de outubro de 2014,
inclusive a Defensoria do Povo veio registrando este aumento de
queixas por parte de vários líderes sociais em relação com os
esquemas de proteção que lhes foram destinados, e de maneira
particular a respeito da falta de recursos para sua mobilização, o
que, sem dúvida, os torna a cada dia mais ineficazes.
São
muitas as queixas postas em conhecimento da Unidade Nacional de
Proteção por defensores de direitos humanos, jornalistas, vítimas
do conflito armado, reclamantes de terras, sindicalistas, entre
outros, com a finalidade de que se tomem as medidas pertinentes para
evitar maiores riscos para a vida e integridade dos ameaçados.
Pedimos contundentemente que de imediato se realizem os necessários
esforços orçamentários para sanar estas deficiências, porque nada
há mais valioso que a vida de qualquer compatriota, e o referido
objetivo deve ser a maior das prioridades orçamentárias.
Por
outra parte, é obrigado mostra nossa preocupação e dor pela
continuação de assassinatos de sindicalistas colombianos. Em menos
de dois meses se produziram dois novos crimes. Nesta ocasião
manifestamos nossa condenação pelo crime contra o líder e
dirigente comunitário Nelson Medina Ortega, quem foi assassinado na
última noite da sexta-feira 17 de outubro em Villavicencio. Medina
Ortega era presidente da ARCA, Associação de Regiões da Área
Circunvizinha de Apiay. Este fato se soma ao ocorrido no último mês
de agosto, quando foi assassinada Edith Santos, quem era fiscal do
Sindicato Nacional de Profissionais de Seguridade, Sinproseg, e
presidenta da Corporação de Juntas de Ação Comunal de
Castilla-Chichimene, também no Meta.
As
audiências de Vítimas não devem se constituir num simples
exercício de exposição da dor causada pelo conflito armado em
Colômbia. Estamos obrigados a atuar adotando medidas imediatas que
evitem a geração de novas vítimas. E nesta mesma linha de ideias
acreditamos que o Estado não pode continuar negando-se a reconhecer
ante a CIDH ou ante qualquer outra instância sua responsabilidade
pelo extermínio da UP, nem negar-se a reparar o dano causado por
este grave caso de vitimização coletiva por motivos políticos, que
não tem antecedentes em todo o hemisfério ocidental. Por isso,
hoje, de maneira especial, mostramos nossa consternação pela atual
negativa do Estado a reconhecer ante a CIDH sua responsabilidade no
caso do desaparecimento forçado, em 1984, de Miguel Ángel Díaz,
ativista do Cartido Comunista Colombiano [PCC].
A 5
de setembro de 1984, Miguel Ángel Díaz e Faustino López Guerrero,
dirigente agrário, se dirigiram a Puerto Boyacá para realizar
atuações de índole política. Na saída de um escritório da
administração pública, Miguel Ángel foi introduzido à força num
veículo, e horas mais tarde Faustino López também foi retido por
pessoas desconhecidas. Os dois permanecem desaparecidos desde então.
Em
29 de maio de 1986, o Tribunal Primeiro Penal do Circuito de Tunja
condenou o agente do Departamento Administrativo de Segurança [DAS],
Jorge Luis Barrero, por estes atos. No entanto, este funcionário do
DAS foi condenado somente a cinco anos de prisão na qualidade de
coautor. O agente do DAS nunca revelou o paradeiro de Miguel Ángel
Díaz nem de Faustino López, nem os nomes dos demais autores dos
desaparecimentos. No processo de investigação se identificaram
outros supostos responsáveis que se negaram a declarar ou não foram
investigados, a maioria deles membros de organismos de segurança do
Estado, funcionários e membros de grupos paramilitares. O processo
penal se adiantou em Tunja porque em Puerto Boyacá, epicentro e
escola do paramilitarismo, não havia garantias para a investigação,
pelo contrário, os investigadores também foram ameaçados, como
está consignado numa constância da Procuradoria.
A 16
de dezembro de 1993, a Corporação Reiniciar pôs à Comissão
Interamericana de Direitos Humanos [CIDH] em conhecimento das graves
violações de direitos humanos das quais foram vítimas os membros
da União Patriótica desde a metade da década dos ’80. Em 12 de
março de 1997 a CIDH proferiu o Informe Nº 11.227 sobre a
admissibilidade do caso de Miguel Ángel. A 24 de março de 2000 se
compôs uma mesa para a solução amistosa do caso; porém, em junho
de 2006 as organizações peticionárias decidiram abandonar esta
via, como conseqüência dos reiterados descumprimentos do governo
nos compromissos adquiridos nesta etapa. Miguel Ángel faz parte do
processo, que continua ainda na Comissão Interamericana, negando-se
o Estado a reconhecer sua responsabilidade neste e em muitos outros
casos.
“O
Governo nega as vítimas da União Patriótica e nega sua
responsabilidade no extermínio. [...] Exigimos que nos reconheçam
ante a CIDH”, disse recentemente a Presidenta da UP Ainda Avella,
ela mesma vítima do extermínio dessa força política.
Como
disse Avella, a assunção de responsabilidades por parte do Estado
colombiano contribuiria de maneira determinante para a paz. Pedimos
que a dita assunção de responsabilidades se faça de imediato e de
forma concreta e explícita em todos os casos de evidente
responsabilidade de agentes do Estado.
É
indispensável que o Estado modifique sua conduta frente ao genocídio
da União Patriótica e que contribua para esclarecer os fatos e
identificar os responsáveis pela perseguição a esse movimento
político, que continua sendo vitimizado.
Todos
estes crimes foram cometidos entre os anos 1986 e 1996, período do
genocídio contra a UP; porém, ao declarar-se de lesa-humanidade
unicamente 34 casos, só se evitará que prescrevam esses, porque, na
maioria deles, transcorreram cerca de 25 anos desde sua
representação. O tempo urge e torna urgente um claro compromisso do
Estado com a Verdade, a justiça, a reparação e a não repetição.
O extermínio da UP não tem segredos. Em palavras do vice-fiscal
geral, Jorge Fernando Perdomo: “se conseguiu determinar que se
trata de ataques cometidos por grupos paramilitares, em alguns casos,
em associação com agentes do Estado”, enquanto se ignoram pelo
menos 3.000 casos, o grosso do genocídio cometido, apesar de que o
vice-fiscal reconhece que estes atentados tiveram um caráter
“generalizado, sistemático e reiterado contra a população
civil”. Recordemos que a Comissão Interamericana de Direitos
Humanos [CIDH] reconheceu como “extermínio político” esse
assassinato de milhares de seus militantes.
Novamente
queremos manifestar que as FARC-EP, em seu interesse por reivindicar
as vítimas do conflito, apresentaram 10 propostas mínimas com
desenvolvimentos específicos representados em pelo menos 50
iniciativas e linhas orientadoras que contemplam soluções práticas
para o reconhecimento de seus direitos, o esclarecimento da verdade e
seu ressarcimento integral.
Reiteramos
ante vocês nosso compromisso explícito com o Direito Internacional
dos Direitos Humanos e o Direito Internacional Humanitário, tendo em
conta as particularidades dos conflitos armados internos, do conflito
colombiano e a existência de uma juridicidade guerrilheira, que
sempre aplicamos consequentemente adotando medidas sancionadoras
contra aqueles que foram responsáveis por ações indevidas.
Novamente,
lhes damos um caloroso abraço de boas-vindas a todos e todas, com a
certeza de que sua contribuição será fundamental para a construção
de um acordo final de paz.
Delegação
de paz das FARC-EP
--
Equipe
ANNCOL - Brasil
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