Por Emir Sader
É o momento em que Washington não tem nada a oferecer aos países que pretendem sair da armadilha neoliberal
Os Estados Unidos saíram triunfantes da Guerra Fria, mas o mundo surgido dali não é nem um mundo de paz, nem de desenvolvimento econômico e justiça social. Ao contrário, focos de guerra só se multiplicam, as intervenções no Afeganistão e no Iraque não conseguem criar condições para que as tropas norte-americanas possam sair desses países mais de dez anos depois das invasões, a maior crise econômica internacional em mais de 80 anos não tem prazo para terminar, produzindo mais desigualdade, pobreza, miséria e exclusão social.
Os Estados Unidos continuam sendo a única superpotência, em um mundo que passou da bipolaridade à unipolaridade. Seu poderio militar é inquestionável, a presença política em todo o mundo e a superioridade tecnológica se mantêm. Para não falar no plano ideológico, em que o “modo de vida americano” é absolutamente hegemônico em escala mundial.
Nos anos 1970, constatava o economista e sociólogo italiano Giovanni Arrighi (1937-2009) haver um consenso de que o capitalismo terminaria, faltava decidir quando e como. Esse fatalismo, baseado numa interpretação mecanicista da história, segundo a qual os tipos de sociedade se sucederam quase que automaticamente, sofreu depois um duro baque. Não apenas o capitalismo sobreviveu, como a primeira forma histórica de existência do socialismo desapareceu.
A partir desse momento a imagem dos Estados Unidos se revigorou, vieram as teorias do “fim da história” e da obrigatoriedade do Consenso de Washington, que acompanhavam a expansão aparentemente irreversível do neoliberalismo. Quando esse modelo começou a revelar seus limites e contradições, voltaram teorias sobre o fim próximo não apenas da hegemonia norte-americana, como do próprio capitalismo. Houve um respeitável historiador, (Karl Marx) que previu que em 50 anos o capitalismo terminaria.
Nenhum sistema econômico e político termina por si mesmo, simplesmente pelo esgotamento. Ele precisa ser vencido e superado por outro. E, apesar de todas as debilidades que ele exibe, o imperialismo norte-americano não encontra ainda no horizonte uma força ou um conjunto de forças que possa superá-lo e substituí-lo.
As contradições e limitações do neoliberalismo fazem com que seja um sistema esgotado, porém isso não basta para que seja substituído nem sequer por outro modelo dentro do capitalismo. Porque há fortes interesses que o sustentam, os dos maiores beneficiários dele – o capital financeiro –, que sempre consegue recolocar seus interesses por cima das crises.
Conforme se acumularam a multiplicação de focos de guerra e a incapacidade norte-americana de dar conta deles, ao lado da crise econômica internacional, iniciada em 2008 e sem horizonte ainda para terminar, proliferaram as visões catastrofistas sobre o futuro daquela hegemonia.
Porém toda análise não tem de partir de uma visão unilateral, apenas baseada nos elementos de debilidade dessa posição. É preciso levar em conta também os elementos de fraqueza na constituição de um outro campo que possa enfrentá-lo. O que compõe um quadro em que, embora declinante, a supremacia norte-americana ainda perdura, ao longo da primeira metade do século 21.
O que há de novo são elementos de um mundo economicamente multipolar, que começou a ser desenhado com o surgimento dos Brics, reunindo países emergentes, situados fora da hegemonia direta dos Estados Unidos e dos organismos internacionais surgidos a partir dos acordos de Bretton Woods, ao fim da Segunda Guerra. Os acordos assinados pelos Brics em Fortaleza, em julho do ano passado, desenham instituições desse mundo multipolar economicamente: um banco de desenvolvimento alternativo ao Banco Mundial, e um fundo de reservas alternativo ao FMI. É um começo da superação daquele poderio, em um momento em que Washington não tem nada a oferecer aos países que pretendem sair da armadilha neoliberal e da crise recessiva internacional.
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