Por
Niko Schvaz
Fui
testemunha presencial da fundação da Frente Ampla pela Paz,
Democracia e Justiça Social da Colômbia, destinada a desempenhar um
papel de primeiro plano na vida política e social deste país; em
particular, para restabelecer o diálogo de paz com as FARC que se
desenvolve em Havana e que foi interrompido abruptamente pelo
presidente Juan Manuel Santos, na meia-noite do domingo 16 de
novembro, devido a retenção do brigadeiro general Rubén Darío
Alzate, que circulava sem escolta vestido à paisana numa zona de
guerra no estado do Chocó.
A
longo de toda a semana passada se sucederam os pronunciamentos em
toda a Colômbia e em nível internacional reclamando a retomada dos
diálogos de paz, com um papel muito destacado dos representantes dos
Estados
garantidores, Cuba e Noruega, da Cruz Vermelha Internacional e das
próprias FARC, assim como de todas as organizações políticas e
sociais da Colômbia que confluíram na criação da Frente Ampla. As
entidades mencionadas estabeleceram um protocolo preciso para dar
curso à libertação dos retidos. O presidente Santos anunciou na
quinta-feira 20 que se havia ativado a operação para libertar as
cinco pessoas e assumiu o compromisso de que, quando se produzisse a
libertação, seriam restabelecidas as negociações de Havana; e no
domingo 23 declarou que isso se produzirá durante a semana que está
em curso, já que nos dias prévios se estabeleceram as coordenadas
geográficas para efetuar a operação de libertação do general
Alzate e de seus dois acompanhantes, o cabo Jorge Rodríguez e a
advogada Gloria Urrego, assim como de dois soldados detidos duas
semanas antes no estado de Arauca, César Rivera e Jonathan Díaz.
Agora, toda a Colômbia e a opinião pública mundial estão
pendentes do cumprimento da promessa, para que siga adiante o
processo de paz.
Entre
os pronunciamentos dos últimos dias nesse sentido, se destaca o da
União de Nações Sul-americanas [UNASUL], cuja secretaria geral
está a cargo do ex-presidente da Colômbia Ernesto Samper. No plano
interno, partidos integrantes da nascente Frente Ampla chamaram a uma
mobilização pelo reinício do diálogo e do cessar-fogo bilateral.
Por exemplo, numa declaração de 19 de novembro intitulada:
“Defender o processo de paz, restabelecer de imediato o diálogo”,
o Partido Comunista assinala: “O presidente Santos deve reconhecer
que em 15 de junho de 2014 os eleitores votaram pela continuidade do
diálogo e pela solução política e para derrotar a proposta da
ultra direita que pretendia pôr fim ao processo de Havana” e
relembra que “os inimigos da paz hoje se regozijam com a
suspensão”. Ao longo de toda a semana vimos através da TeleSul
uma sucessão de manifestações em toda a extensão da Colômbia
reclamando a retomada dos diálogos de paz.
Relembramos
também que no ato de criação da Frente Ampla colombiana se exibiu
um vídeo gravado em Cuba pelo dirigente das FARC e participante nas
conversações de Havana, Pablo Catatumbo, quem saudou ao nascente
organismo político unitário destacando o papel que está chamado a
desempenhar em prol da consolidação do processo de paz.
Neste
ato, efetuado no sábado 15-N na Universidade Autônoma da Colômbia
[UAC] em Bogotá, confluiu um conjunto muito numeroso de organizações
políticas, sociais e culturais, enlaçadas por um objetivo comum e
como expressão de um arraigado conceito de unidade na diversidade.
Entre elas, Marcha Patriótica [representada pela ex-senadora Piedad
Córdoba, de muito ativa participação política], vários setores
do Polo Democrático, do Movimento Agrário Indígena e Social
[MAIS], da União Patriótica representada por Aida Abella, do Polo
Democrático Alternativo presidido por Clara López, do grupo
Progressistas do prefeito Gustavo Petro, restituído em seu cargo,
assim como Bogotá pela Paz, do Partido Comunista com Jaime Caycedo,
Presentes pelo Socialismo, da Organização Indígena da Colômbia
[OIC], da Cúpula Agrária, do Partido Verde, do Movimento pelos
Direitos do Povo, da União de Trabalhadores da Colômbia,
representada por seu secretário-geral, e outras.
A
Frente Ampla colombiana nasceu com o apoio expresso das forças
políticas de esquerda da América Latina Caribenha, que se articulam
no Foro de São Paulo [FSP], e que se expressaram numa jornada
efetuada na sexta-feira 14-N na sede do Congresso colombiano. Ali se
expuseram as experiências unitárias da Frente Ampla do Uruguai, do
Partido dos Trabalhadores do Brasil, do Aliança País do Equador, do
próprio Foro de São Paulo e do Movimento ao Socialismo da Bolívia,
representado este último por Leónida Zurita, uma típica integrante
dos movimentos indígenas. Pudemos apreciar que os companheiros
colombianos avaliaram estas experiências como uma positiva
contribuição à construção de sua força política unitária.
Assim o estabelecem expressamente no início do documento emanado de
seu encontro constitutivo, nestes termos: “Em nosso encontro
tivemos a alegria de contar com a participação de delegados de
Uruguai, Equador, Bolívia e Brasil, assim como do Foro de São
Paulo, os quais nos compartilharam sua experiência unitária que
lhes permitiu chegar a ser governo e promover mudanças
significativas em seus países. Decerto, sua importante trajetória e
respaldo latino-americano nos brindarão significativas contribuições
no caminho unitário que hoje retomamos com renovada energia, ao qual
eles também nos convocam”.
Esta
é a melhor introdução possível a uma breve análise deste
documento, aprovado por unanimidade e aclamação ao término da
reunião constitutiva da Frente Ampla pela Paz, Democracia e Justiça
Social da Colômbia.
Uma
alternativa de governo e poder
O mesmo expressa em seu início “com imensa alegria” que se criou a Frente Ampla, com “um espírito unitário e plural, no qual as organizações políticas, sociais, ambientais, culturais, étnicas, nacionais e locais pusemos o conjunto de nossos acumulados de mobilização, organização e exercícios de governo em função de encontrar-nos para materializar o anseio de paz e de construção de uma alternativa política de poder e de mudança. Os colombianos e as colombianas assistimos a um momento excepcional que pode abrir caminho a mudanças históricas”.
O mesmo expressa em seu início “com imensa alegria” que se criou a Frente Ampla, com “um espírito unitário e plural, no qual as organizações políticas, sociais, ambientais, culturais, étnicas, nacionais e locais pusemos o conjunto de nossos acumulados de mobilização, organização e exercícios de governo em função de encontrar-nos para materializar o anseio de paz e de construção de uma alternativa política de poder e de mudança. Os colombianos e as colombianas assistimos a um momento excepcional que pode abrir caminho a mudanças históricas”.
Em
seguida, entra pra valer no processo de paz. Diz que deve estender-se
ao ELN e demais insurgências e que “a paz que o povo reivindica
requer mudanças e reformas sociais para romper a injustiça e a
insultante desigualdade, assim como uma abertura democrática que
reconheça novos direitos e assegure os existentes”. Critica neste
aspecto a atitude do governo de Santos e afirma que “a paz
democrática será possível mediante a mais ampla confluência de
todos os setores democráticos, progressistas e de esquerda, numa
forte torrente que apaixone, por sua vez, as maiorias de nosso país”.
Nesse sentido, se propõem contribuir para articular as diversas
iniciativas em prol da paz que se desenvolvem no país, ao tempo de
respaldar e aprofundar os diálogos de paz, e convocam todos os
setores para a criação de um vigoroso movimento social pela paz.
O
parágrafo seguinte é definitório e traça uma perspectiva: “Nos
encontramos aqui para construir entre todos e todas uma alternativa
política que nos permita ser governo e poder para promover as
urgentes mudanças que nosso país reivindica”.
Passa
depois a especificar quais são essas mudanças urgentes. Em primeiro
termo, o respaldo aos processos de paz [os que existem e os que
virão] e o cessar bilateral do fogo. Em seguida, uma verdadeira
reforma política que democratize o sistema político colombiano,
assim como a igualdade de direitos para as mulheres. Segue a defesa e
construção do território, da natureza e dos bens comuns; a
salvaguarda da soberania nacional; a solidariedade internacional e a
unidade e integração da América Latina.
Se
propõem, ademais, estender pontes a partir da Frente Ampla para que
todos os setores participantes encarem de maneira unitária as
eleições de 2015, e abordar o processo de criação de uma
Assembleia Nacional Constituinte.
Em
síntese final, promovem um trabalho conjunto para que 2015 seja o
ano da mobilização social e política pela paz, iniciada desde
dezembro de 2014 com uma grande Cúpula de convergência pela paz,
seguida pelo Congresso constituinte pela paz em 9 de abril de 2015 e
a construção de frentes amplas estaduais [departamentais] e
municipais em todo o país, de frente com a realização do Segundo
encontro nacional da Frente Ampla no mês de maio.
Assinalam
que se propõem trabalhar “sobre a base da unidade na diversidade”,
superar esquemas que conduziram ao imobilismo, ao desencontro e à
fragmentação; a tomar como centro da experiência unitária as
bases, promovendo encontros locais e regionais para construir uma
perspectiva nacional; e a seguir seu trabalho juntamente com a
mobilização social e popular, a partir de práticas inclusivas, do
reconhecimento da diversidade, da ética e da mudança das práticas
no exercício da política. Se definem nos seguintes termos: “Somos
somatória de ações, vontades, convicções e disposição. Um
espaço aberto e convocador, produto de nossas deliberações e
coincidências como processos regionais, indígenas, agrários,
afrocolombianos, sindicais, da diversidade sexual, das novas
cidadanias, estudantis, magisteriais, urbanos, da cultura, das
organizações locais, assim como também de convergência das
dinâmicas nacionais”.
Concluindo,
expressam “a certeza de que nossa potente unidade na diversidade
nos permitirá alcançar os sonhos de paz e da reconciliação de
nosso país [...] e construir uma Colômbia soberana, digna e
realmente democrática”.
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