terça-feira, 16 de dezembro de 2014

“Somos rebeldes, não narcotraficantes”

Recentemente, escutamos o chefe da Delegação do Governo, doutor Humberto De la Calle, e o Presidente Juan Manuel Santos referirem-se à necessidade de reconhecer a natureza do delito político e suas conexões, afirmando o mais básico acerca da rebelião, enquanto a que é um direito fundamental, um direito humano, um direito dos povos.
Nesta mesma semana, na Cúpula Ibero-americana, no México, novamente, o primeiro mandatário aludiu ao delito político, porém associando-o ao narcotráfico. Ao fazê-lo dessa maneira, confunde na mente dos colombianos e de muitos no mundo a imagem do guerrilheiro com a do narcotraficante, incorrendo numa distorção conceitual de fundo, que, em vez de concitar apoio à causa da paz, gera confusão.
Esta confusão que desfigura a luta altruísta, que implica o legítimo desejo à rebelião, de alguma maneira aponta a assinalar as FARC-EP como um grupo de narcotraficantes.
Neste contexto, os argumentos dos altos funcionários do Estado, que aparentemente estariam ordenados a ampliar os conexos ao delito político, como parte das saídas jurídicas que viabilizem a paz, no fundo o que buscam é o desprestígio de uma força rebelde que, por princípio, considera nociva a existência do negócio capitalista do narcotráfico.
As FARC-EP temos exposto e assumido sempre, com responsabilidade e interesse, o debate público sobre o fenômeno do narcotráfico como um problema social e global, que requer o concurso das nações do mundo para sua solução. De fato, o acordo parcial do quarto ponto da Agenda de Diálogos assim o confere, e evidente é que está construído a partir de nossas propostas mínimas que o país conhece e que acusam ao setor financeiro, através da lavagem de ativos, como seu motor fundamental.
O delito político é outro assunto. A rebelião é delito político e todo ato, toda conduta que se realize para fazê-la efetiva tem caráter conexo.
A luta de meio século das FARC-EP se prende às condutas de tipo político e militar que configuram a rebelião; elas têm tido como objetivo supremo avançar na construção de outra Colômbia, em liberdade e democracia. E nisto se incluem os atos de financiamento que distintos setores tocaram, incluídos traficantes de todo tipo de mercadorias legais e ilegais, sem envolver-nos em procedimentos de cultivo de maconha, coca ou amapola, nem em atividades de produção ou comercialização de drogas de uso ilícito.
As atividades realizadas pelas FARC-EP, todas, têm sido executadas em função da rebelião, e assim ficou conferido e superado no pactuado sobre o ponto 4º do Acordo Geral, “Solução ao problema das drogas ilícitas”. De tal maneira que as acusações que nos liguem ao narcotráfico são pérfidas e inúteis no processo da reconciliação.
Nunca admitimos nem admitiremos ser narcotraficantes ou que os fatos que configuram o complexo fenômeno do narcotráfico se assimilem, em seu conjunto, ao caráter que têm o delito político e a rebelião; entre outras considerações, porque nunca poderíamos aceitar que um negócio, qualquer que seja, destinado ao enriquecimento pessoal, possa ser admitido como altruísta e revolucionário, menos ainda quando neles estão articuladas verdadeiras organizações e redes criminais transnacionais, cujo ninho é o poder financeiro mundial. Para o caso da Colômbia, este poder se cristalizou em grupos banqueiros, em cúpulas econômicas e políticas ligadas à lavagem de ativos, à especulação, à construção, à indústria, ao latifúndio, ao paramilitarismo, desde os tempos do Diretor da Aeronáutica Civil, de janeiro de 1980 a agosto de 1982, que concedeu centenas de licenças para circulação de aeronaves e pistas de aterrisagem de capos do narcotráfico.
Assim como as FARC-EP desenvolvem propostas na Mesa de Diálogos para recuperar o campo transversal e transparente do delito político e sua conexidade, diferenciando por razões éticas, políticas e jurídicas um rebelde de um paramilitar, ou de um narcotraficante, também vamos seguir insistindo no cumprimento de obrigações como a que se consagrou no Acordo sobre drogas ilícitas, referida ao tratamento penal diferenciado, para que o Estado não se enfureça contra pequenos agricultores que estejam ou estiveram vinculados com cultivos de uso ilícito, quando grandes narcotraficantes e patrocinadores estão livres e acomodados nas benesses do poder. Insistimos, portanto, no combate aos verdadeiros narcotraficantes, que são os comercializadores e lavadores de dinheiro.
Com o propósito de estabelecer critérios transparentes nesta matéria, será muito benéfico que o governo cumpra com o compromisso do ponto 4.3.6 do acordo parcial referido a esta temática que expressa que “No marco da discussão do ponto 5.2 da Agenda do Acordo Geral se estabelecerá o mecanismo que deverá, entre outros, abordar o tema do esclarecimento da relação entre produção e comercialização de drogas ilícitas e conflito, incluindo a relação entre o paramilitarismo e o narcotráfico...”.
Não estamos contra construir uma saída política, jurídica, de diálogo, de consenso social, nacional e internacional frente ao tema das drogas e dos circuitos que se alimentam desse flagelo e que, ao mesmo tempo, reforçam-no. Porém, a via não é relacionando o direito universal à rebelião e a categoria do delito político e sua conexidade ampla com um negócio de benefício pessoal lucrativo, que é oposto às razões altruístas, à essência e ao ideário humanista que as FARC-EP defendem.
DELEGAÇÃO DE PAZ DAS FARC-EP
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Equipe ANNCOL - Brasil

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