sábado, 4 de abril de 2015

Só um magnicídio poria em perigo o processo de paz: De Zubiría

Por Augusto Aponte
O integrante da Comissão Histórica crê que Constituinte é a melhor via para ratificar a paz.
Uma grande expectativa se gerou em torno da discussão entre o Governo e as Farc pelo tema de se o processo de paz é irreversível ou não.
No seio da Comissão Histórica do Conflito e suas Vítimas, criado em Havana, saiu uma voz alertando sobre o perigo que poderiam correr os acordos por uma trama que se estaria planejando entre setores inimigos dos diálogos.
Sergio Zubiría, licenciado em Filosofia e mestre em História, disse a Kienyke.com que a única coisa que faria desequilibrar o processo de paz a estas alturas é um magnicídio. “Por exemplo, um magnicídio contra os comandantes em Havana, ou o assassinato do ex-presidente Uribe, e isto não é nada descabido”, indicou.
Ainda que tenha assegurado que não quer ser uma ave de mau agouro, de Zubiría assinalou que há que tomar todas as medidas de segurança e estar alertas nesta última fase do processo de paz, que, segundo disse, é a mais difícil.
Por que é a mais difícil?
De Zubiría, quem é um dos doze integrantes da Comissão Histórica do Conflito e suas Vítimas, assinalou que como os acordos estão em sua parte final, os inimigos dos mesmos assestarão baterias contra eles. Ademais, assinalou que as discussões em Havana ficarão mais intensas porque se está debatendo o desarmamento e a reinserção, junto com a participação política.
Além disso, assinalou que, apesar das demonstrações de boa vontade de ambas as partes, o processo não tem estado isento de problemas e inconvenientes. “Há muitos elementos esperançosos, porém ao mesmo tempo vemos elementos como a ruptura da trégua, setores de extrema direita que não querem envolver-se no processo; vemos que a própria Comissão Assessora da Paz tem elementos de falta de representatividade”.
Frente a este último tema, o filósofo e historiador manifestou que “não há grêmios dos próprios terra-tenentes, não há associações campesinas, tampouco há representação de partidos políticos”.
No entanto, Sergio de Zubiría ressaltou os acordos alcançados até o momento entre o Governo e as Farc, ainda que admitiu que não se trata de uma reforma estrutural, manifestou que é um passo positivo para reconhecer a população mais vulnerável do país e repará-las.
“O que se pactua em Havana no primeiro ponto não é uma reforma agrária e sim um fundo de terras para entrega gratuita aos campesinos despossuídos. Aspiramos a que seja um fundo de três a cinco milhões de hectares, para que os mais pobres voltem das cidades para o campo”, disse.
Frente ao tema da representação política no pós conflito, ressaltou que a discussão se centrou na criação de uma circunscrição especial na Câmara de Representantes para aquelas “zonas que foram as mais ensanguentadas, onde não participarão os partidos tradicionais mas sim novos movimentos sociais e campesinos, deixando por fora também as Farc. Isto abre a possibilidade de participação política a grupos que nunca chegaram ao Congresso”, disse.
A respeito de se os chefes guerrilheiros desmobilizados devem pagar cárcere, o integrante da Comissão Histórica do Conflito se mostrou em desacordo com esta tese.
“Não é em todo processo de negociação que há que ir para o cárcere, está o exemplo do Nepal, Filipinas, das guerrilhas da América Central, nos que por ser um delito político, uma rebelião, não pagaram nenhum dia de cárcere; simplesmente repararam à sociedade com verdade, com reparações simbólicas. Em Colômbia, de que nos tem servido que tenha ido para o cárcere um grupo de paramilitares?, de que tem servido às vítimas? Há uma visão punitiva, vingativa, de que a única forma de fazer justiça é a retaliação”, assinalou.
Assegurou que as vítimas em Havana não pediram cárcere para os guerrilheiros e sim um cessar-fogo bilateral.
Por último, no tema de como devem ser ratificados os acordos, de Zubiría assegurou que para as reformas que o pós conflito necessita é necessário convocar uma Assembleia Nacional Constituinte.
“Há que reconhecer que para ratificar os acordos em Havana há mecanismos mistos; há umas coisas que poderiam ir a referendo e outros deveriam ir a uma Assembleia Constituinte, como, por exemplo, para o caso da educação, da justiça, pois o do equilíbrio de poderes apenas são paninhos de água morna, o que se necessita é abrir um debate grande em Colômbia”, manifestou.
Comissão Histórica do Conflito e suas Vítimas
Para que foi criada esta Comissão? Sergio de Zubiría explicou como nasceu esta ideia:
Em agosto de 2014, a mesa de Havana chegou a um acordo para criar uma comissão histórica para esclarecer as raízes do conflito. Uma vez que se chegou ao acordo de seu funcionamento e das perguntas que tinha que responder, se começou a criar uma lista de intelectuais e acadêmicos que poderiam contribuir com essa comissão.
Tanto as Farc como o Governo designaram doze membros que ao término de quatro meses devia, cada um, escrever um informe de 40 páginas que respondessem as seguintes perguntas: Qual foi a origem e as causas do conflito armado? Quais são os fatores e condições da persistência do conflito? Quais têm sido os impactos maiores na população? e Quais são as responsabilidades?
Os informes foram entregues a dois relatores: o ex-reitor da Universidade Nacional Víctor Manuel Moncayo e o embaixador da Colômbia em Haia, Eduardo Pizarro León-Gómez. As duas relatorias fizeram um só informe com os doze informes entregues inicialmente, e este contou com mais de 800 páginas.
O que cada integrante da comissão tinha que fazer era ler, recopilar e estudar trabalhos investigativos já elaborados. “Eu escolhi um grupo de historiadores, escritores, sociólogos, politicólogos que já fizeram trabalhos consolidados para responder as quatro perguntas formuladas. Fiz referência a Germán Colmenares, Álvaro Tirado Mejía, Marco Palacios. Depois, o que fiz foi organizar os autores dependendo da intencionalidade das perguntas, e sistematizar teses, elaborar críticas sobre a guia”, explicou.
No entanto, o analista assinalou que esta comissão histórica não tem precedente nos processos de negociação a nível mundial, pois se compôs sem que se tenha acabado o conflito, e o que busca é dar insumos para que sejam levados em conta pela comissão da verdade, que teria que ser criada com a firma do acordo.
De fato, dias atrás as Farc advertiram ao Governo que as conclusões que a Comissão Histórica apresentou têm que ser levadas em conta e não convertê-las numa mera saudação à bandeira.
Segundo indicou Sergio de Zubiría, as causas do conflito armado são profundas e múltiplas. “Desde o primeiro informe de 1962, que é originário do debate, se fala da multicausalidade e da complexidade do mesmo. Assuntos que poderiam ser resolvidos a partir de reformas sociais, agrárias, porém que não se fizeram ou se adiaram, foram se acumulando as causas e o conflito foi se tornando mais grave”.
Assegurou, ademais, que “hoje em dia, as causas do conflito não são exatamente iguais, porém, sim, tem havido uma persistência das mesmas causas da origem da confrontação armada [...] e da maior impunidade em Colômbia seria deixar intactas as causas que desencadearam o conflito armado”.
Por outro lado, de Zubiría ressaltou a cúpula mundial sobre paz que se levará a cabo em Bogotá de seis a dez de abril e a grande marcha nacional pela paz, “na qual se aspira que cheguem a Bogotá cerca de 200 mil pessoas, campesinos, indígenas, afrodescendentes”.



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Equipe ANNCOL - Brasil




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